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Quem é a Pedra: Jesus ou Pedro?

Jesus e Pedro

Por Karl Keating
Fonte: Veritatis Splendor

O diálogo a seguir ilustra muito bem um debate entre um católico e um protestante quando este argumenta que a “Pedra” citada por Jesus em Mt 16,18 jamais poderia referir-se a Pedro, mas sim ao próprio Jesus, uma vez que as Sagradas Escrituras em muitas passagens identifica Jesus como a “rocha”, a “pedra angular”.

Antes de apresentar o diálogo, a Barca de Jesus observa que embora na maioria das passagens bíblicas “pedra” ou “rocha” realmente se refira a Jesus, existem exceções. O próprio Jesus que disse ser a “Luz do Mundo” (Jo 8,12) disse aos apóstolos que também eles deveriam ser “Luz do Mundo” (Mt 5,13). Além da passagem de Mt 16,18 onde a “pedra” referida não se trata de Jesus, como veremos claramente no diálogo abaixo, temos também, por exemplo, Is 51,1-2 (a “pedra” é Abraão) e 1Pd 2, 4-5 (“pedras vivas” é Jesus e também são os cristãos).

O fato de Jesus aplicar a Pedro uma figura que a Bíblia exaustivamente aplica a Jesus, bem mostra a intenção de Jesus em fazer de Pedro um representante de Cristo na terra. O que, por sinal, Ele confirmou explicitamente ao dar autoridade a Pedro não apenas de ligar e desligar na terra, mas também no Céu. Vamos, então, ao diálogo:

Protestante:

Em grego, a palavra para pedra é petra, que significa uma rocha grande e maciça. A palavra usada como nome para Simão, por sua vez, é petros, que significa uma pedra pequena, uma pedrinha.

Católico:

Na verdade, todo este discurso é falso. Como sabem os conhecedores de grego (mesmo os não católicos), as palavras petros e petra eram sinônimos no grego do primeiro século. Elas significaram “pequena pedra” e “grande rocha” em uma velha poesia grega, séculos antes da vinda de Cristo, mas esta distinção já havia desaparecido no tempo em que o Evangelho de São Mateus foi traduzido para o grego. A diferença de significados existe, apenas, no grego ático, mas o NT foi escrito em grego Koiné – um dialeto totalmente diferente. E, no grego koiné, tanto petros quanto petra significam “rocha”. Se Jesus quisesse chamar Simão de “pedrinha”, usaria o termo lithos. (para a admissão deste fato por um estudioso protestante, veja D. Carson, The expositors Bible Commentary [Grand Rapids: Zondervan, 1984], Frank E. Gaebelein, ed., 8: 368).

Porém, ignorando a explicação, insiste o protestante:

Vocês, católicos, por desconhecerem o grego, pensam que Jesus comparava Pedro à rocha. Na verdade, é justamente o contrário. Ele os contrastava. De um lado, a rocha sobre a qual a Igreja seria construída: o próprio Jesus (“e sobre esta PETRA edificarei a Minha Igreja”). De outro, esta mera pedrinha (“Simão tu és PETROS”). Jesus queria dizer que ele mesmo seria o fundamento da Igreja, e que Simão não estava sequer remotamente qualificado para isto.

Católico:

Concordo que devemos ir do português para o grego. Mas, com certeza, você concordará que, igualmente, devemos ir do grego para o aramaico. Como você sabe, esta foi a língua falada por Jesus, pelos apóstolos e por todos os judeus da Palestina. Era a língua corrente da região.

Muitos, talvez a maioria, soubessem grego, pois esta era a língua franca do Mediterrâneo. A língua da cultura e do comércio. A maioria dos livros do NT foi escrita em grego, pois não visavam apenas os cristãos da Palestina, mas de outros lugares como Roma, Alexandria e Antioquia, onde o aramaico não era falado.

Sabemos que Jesus falava aramaico devido a algumas de suas palavras que nos foram preservadas pelos Evangelhos. Veja Mt 27,46, onde ele diz na cruz, “Eli, Eli, Lama Sabachtani”. Isto não é grego, mas aramaico, e significa, “meu Deus, meu Deus, porque me abandonaste?”

E tem mais: nas epístolas gregas de S. Paulo (por 4 vezes em Gálatas e outras 4 vezes em 1Coríntios), preservou-se a forma aramaica do novo nome de Simão. Em nossas bíblias, aparece como Cefas. Isto não é grego, mas uma transliteração do aramaico Kepha (traduzido por Kephas na forma helenística).

E o que significa Kepha? Uma pedra grande e maciça, o mesmíssimo que petra. A palavra aramaica para uma pequena pedra ou pedrinha é evna. O que Jesus disse a Simão em Mt 16,18 foi “tu és Kepha e sobre esta kepha construirei minha igreja.”

Quando se conhece o que Jesus disse em aramaico, percebe-se que ele comparava Simão à rocha; não os estava contrastando. Podemos ver isto, vividamente, em algumas versões modernas da bíblia em inglês, nas quais este versículo é traduzido da seguinte forma: ‘You are Rock, and upon this rock I will build my church’. Em francês, sempre se usou apenas pierre tanto para o novo nome de Simão, quanto para a rocha.

Protestante:

Se kepha significa petra, porque a versão grega não traz “tu és Petra e sobre esta petra edificarei a minha Igreja”? Por que, para o novo nome de Simão, Mateus usa o grego Petros que possui um significado diferente do petra?

Católico:

Porque não havia escolha. Grego e aramaico têm diferentes estruturas gramaticais. Em aramaico, pode-se usar kepha nas duas partes de Mt 16,18. Em grego, encontramos um problema derivado do fato de que, nesta língua, os substantivos possuem terminações diferentes para cada gênero.

Existem substantivos femininos, masculinos e neutros. A palavra grega petra é feminina. Pode-se usá-la na segunda parte do texto sem problemas. Mas não se pode usá-la como o novo nome de Simão, porque não se pode dar, a um homem, um nome feminino. Há que se masculinizar a terminação do nome. Fazendo-o, temos Petros, palavra já existente e que também significava rocha. (Obs da Barca de Jesus: Estrutura semelhante ocorre na língua portuguesa: Pedro e pedra.)

Por certo, é uma tradução imperfeita do aramaico; perdeu-se parte do jogo de palavras. Mas, em grego, era o melhor que poderia ser feito.

Além da evidência gramatical, a estrutura da narração não permite uma diminuição do papel de Pedro na Igreja. Veja a forma na qual se estruturou o texto de Mt 16,15-19. Jesus não diz: “Bendito és tu, Simão. Pois não foi nem a carne nem o sangue que te revelou este mistério, mas meu Pai, que está nos céus. Por isto, eu te digo: és uma pedrinha insignificante, e sobre a rocha edificarei a minha Igreja. … Eu te darei as chaves do reino dos céus.”

Ao contrário, Jesus abençoa Pedro triplamente, inclusive com o dom das chaves do reino, mas não mina a sua autoridade. Isto seria contrariar o contexto. Jesus coloca Pedro como uma forma de comandante ou primeiro ministro abaixo do Rei dos Reis, dando-lhe as chaves do Reino. Como em Is 22,22, os reis, no AT, apontavam um comandante para os servir em posição de grande autoridade, para governar sobre os habitantes do reino. Jesus cita quase que verbalmente esta passagem de Isaías, o que torna claríssimo aquilo que Ele tinha em mente. Ele elevou Pedro como a figura de um pai na família dos cristãos (Is 22,21), para guiar o rebanho (Jo 21,15-17). Esta autoridade era passada de um homem para outro através dos tempos pela entrega das chaves, que se usavam sobre os ombros em sinal de autoridade. Da mesma forma, a autoridade de Pedro foi transmitida, nestes dois mil anos, através do papado.

Reflexões acerca do primado do Papa e de sua infalibilidade

“Chegando ao território de Cesaréia de Filipe, Jesus perguntou a seus discípulos: ‘No dizer do povo, quem é o Filho do homem?’ Responderam: ‘Uns dizem que é João Batista; outros, Elias; outros, Jeremias ou um dos profetas.’ Disse-lhes Jesus: ‘E vós quem dizeis que eu sou?’ Simão Pedro respondeu: ‘Tu és o Cristo, o Filho de Deus vivo!’ Jesus então lhe disse: ‘Feliz és, Simão, filho de Jonas, porque não foi a carne nem o sangue que te revelou isto, mas meu Pai que está nos céus. E eu te declaro: tu és Pedro, e sobre esta pedra edificarei a minha Igreja; as portas do inferno não prevalecerão contra ela. Eu te darei as chaves do Reino dos céus: tudo o que ligares na terra será ligado nos céus, e tudo o que desligares na terra será desligado nos céus.'” (Mt 16, 13-19)

Cristo estabeleceu um verdadeiro primado em Sua Igreja, conferindo a São Pedro as chaves do Reino. A Bíblia mostra, na passagem acima, a promessa de Nosso Senhor ao Príncipe dos Apóstolos: estabelecerá sobre ele a Sua única Igreja. Mais tarde, antes de subir ao céu, irá conferir o primado a Pedro, cumprindo Suas santíssimas palavras.

De fato, é preciso que na Igreja exista autoridade, e essa é a razão de ser do episcopado – o conjunto dos Bispos, sucessores dos Apóstolos. Todavia, para haver uma unidade nesse episcopado, Cristo instituiu, como vínculo indispensável entre seus detentores, o primado. O primado é a capacidade de São Pedro, e seus sucessores, de liderar a Igreja, como atesta a Escritura. Assim, vemos pelos textos dos Atos dos Apóstolos e mesmo pelos Evangelhos, escritos todos após Pedro ter recebido o primado, como este Apóstolo tem destaque sobre os demais, e como lhe é reservada uma nítida posição de liderança. Se os Apóstolos exercem autoridade sobre a Igreja Católica, São Pedro é a palavra final entre eles. Primado e episcopado derivam, portanto, da única autoridade conferida por Jesus Cristo à Igreja.

Bento XVI: Pedro, a rocha sobre a qual Cristo fundou a Igreja

Intervenção na audiência geral de quarta-feira

CIDADE DO VATICANO, quarta-feira, 7 de junho de 2006 (ZENIT.org).- Publicamos a intervenção de Bento XVI pronunciada durante a audiência geral desta quarta-feira, dedicada a comentar o tema «Pedro, a rocha sobre a qual Cristo fundou a Igreja».

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Queridos irmãos e irmãs:

Reiniciamos as catequeses semanais que começamos nesta primavera. Na última delas, há quinze dias, tínhamos falado de Pedro como o primeiro apóstolo; hoje queremos voltar a falar mais uma vez sobre esta grande e importante figura da Igreja. O evangelista João, ao narrar o primeiro encontro de Jesus com Simão, irmão de André, constata um dado singular: «Jesus, fixando seu olhar nele, disse-lhe: ?Tu és Simão, o filho de João, tu te chamarás Cefas?, que quer dizer, ?Pedra?» (João 1, 42). Jesus não costumava mudar o nome de seus discípulos. Com exceção do apelido de «filhos do trovão», dirigido em uma circunstância precisa aos filhos de Zebedeu (cf. Marcos 3, 17), e que depois não utilizará, nunca atribuiu um novo nome a um de seus discípulos. Contudo, ele o fez com Simão, chamando-o de Cefas, nome que depois foi traduzido em grego como «Petros», em latim «Petrus». E foi traduzido precisamente porque não era só um nome; era um «mandato» que Petrus recebia desse modo do Senhor. O novo nome, «Petrus», voltará a aparecer em várias ocasiões nos Evangelhos e acabará substituindo seu nome original, Simão.

Este dado alcança particular importância se levamos em conta que, no Antigo Testamento, a mudança de nome anunciava em geral a entrega de uma missão (cf. Gênesis 17, 5; 32,28ss, etc). De fato, a vontade de Cristo de atribuir a Pedro um especial destaque dentro do colégio apostólico se manifesta através de numerosos indícios: em Cafarnaum, o Mestre se hospeda na casa de Pedro (Marcos 1, 29); quando a multidão se reúne na margem do lago de Genezaré, entre as duas barcas amarradas, Jesus escolhe a de Simão (Lucas 5, 3); quando em circunstâncias particulares Jesus só fica em companhia de três discípulos, Pedro sempre é recordado como o primeiro do grupo: assim sucede na ressurreição da filha de Jairo (cf. Marcos 5, 37; Lucas 8, 51), na Transfiguração (cf. Marcos 9, 2; Mateus 17, 1; Lucas 9, 28), e por último durante a agonia no Horto do Getsêmani (cf. Marcos 14, 33; Mateus 16, 37). A Pedro se dirigem os arrecadadores de impostos para o Templo, e o Mestre paga por ele e por Pedro, e não apenas por ele (cf. Mateus 17, 24-27); foi o primeiro a quem Jesus lavou os pés na última Ceia (cf. João 13, 6), e só reza por ele, para que não desfaleça na fé e possa confirmar depois nela os demais discípulos (cf. Lucas 22, 30-31).

Por outro lado, o próprio Pedro é consciente dessa posição particular que tem: é ele quem fala com freqüência, em nome dos outros, pedindo explicações ante uma parábola difícil (Mateus 15, 15), ou para perguntar o sentido exato de um projeto (cf. Mateus 18, 21) ou a promessa formal de uma recompensa (Mateus 19, 27). Em particular, é ele quem supera o impacto de certas situações, intervindo em nome de todos. Deste modo, quando Jesus, ferido pela incompreensão da multidão após o discurso sobre o «pão da vida», pergunta: «Também vós quereis ir?», a resposta de Pedro é rápida: «Senhor, a quem iremos? Só Tu tens palavras de vida eterna» (Mateus 16, 15-15). Jesus pronuncia então a declaração solene que define, de uma vez por todas, o papel de Pedro na Igreja: «E eu te digo que tu és Pedro, e sobre esta pedra edificarei a minha Igreja, e as portas do inferno não prevalecerão contra ela. A ti darei as chaves do Reino dos Céus; o que atares na terra será atado nos céus, e o que desatares na terra será desatado nos céus» (Mateus 16, 18-19). As três metáforas às quais recorre Jesus são em si muito claras: Pedro será o cimento de rocha sobre o qual estará o edifício da Igreja; terá as chaves do Reino dos céus para abrir e fechar a quem lhe pareça justo; por último, poderá atar e desatar, ou seja, poderá estabelecer ou proibir o que considere necessário para a vida da Igreja, que é e continuará sendo de Cristo. É sempre a Igreja de Cristo e não de Pedro. Descreve com imagens plásticas o que a reflexão sucessiva qualificará com o termo «primado de jurisdição».

Esta posição preeminente que Jesus quis entregar a Pedro se constata também depois da ressurreição: Jesus encarrega às mulheres que levem o anúncio a Pedro, distinguindo-o entre os demais apóstolos (cf. Marcos 16, 7); acode correndo a ele e a João a Madalena para informar que a pedra foi removida da entrada do sepulcro (cf. João 20, 2), e João lhe cederá o passo quando os dois cheguem ante o túmulo vazio (cf. João 20, 4-6); Pedro será depois, entre os apóstolos, a primeira testemunha da aparição do Ressuscitado (cf. Lucas 24, 34; 1 Coríntios 15, 5). Este papel , sublinhado com decisão (cf. João 20, 3-10), marca a continuidade entre a preeminência no grupo dos apóstolos e a preeminência que continuará tendo na comunidade nascida com os acontecimentos pascais, como testifica o livro dos Atos dos Apóstolos (cf. 1, 15-26; 2, 14-40; 3, 12-26; 4,8-12; 5,1-11.29; 8, 14-17; 10, etc). Seu comportamento é considerado tão decisivo que é objeto de observações e também de críticas (cf. Atos 11, 1-18; Gálatas 2, 11-14). No assim chamado Concílio de Jerusalém, Pedro desempenha uma função diretiva (cf. Atos 15 e Gálatas 2, 1-10), e precisamente pelo fato de ser a testemunha da fé autêntica, o próprio Paulo reconhecerá nele um papel de «primeiro» (Cf. 1 Coríntios 15, 5; Gálatas 1, 18; 2,7 seguintes, etc). Também, o fato de que vários dos textos chaves referidos a Pedro possam ser marcados no contexto da Última Ceia, na qual Cristo confere a Pedro o ministério de confirmar os irmãos (cf. Lucas 22, 31 seguintes), mostra como a Igreja, que nasce do memorial celebrado na Eucaristia, tem no ministério confiado a Pedro um de seus elementos constitutivos.

Este contexto do Primado de Pedro na Última Ceia, no momento da instituição da Eucaristia, Páscoa do Senhor, indica também o sentido último desse Primado: para todos os tempos: Pedro tem que ser o custódio da comunhão com Cristo; tem que guiar até a comunhão com Cristo, de forma que a rede não se rompa, mas que sustente a grande comunhão universal. Só juntos podemos estar com Cristo, que é o Senhor de todos. A responsabilidade de Pedro consiste em garantir assim a comunhão com Cristo, com a caridade de Cristo, guiando até a realização dessa caridade na vida de todos os dias. Rezemos para que o primado de Pedro, confiado a pobres seres humanos, seja sempre exercido neste sentido original desejado pelo Senhor, e para que o possam reconhecer cada vez mais em seu significado verdadeiro os irmãos que ainda não estão em comunhão conosco.

[Traduzido por Zenit. Ao final da audiência, o Papa saudou os peregrinos de língua portuguesa:]

Amados peregrinos de língua portuguesa, uma cordial saudação de boas-vindas para todos, nomeadamente para o grupo referido de Portugal! Viestes a Roma para revigorar a vossa fé cristã e os vínculos de amor e obediência à Igreja, que Jesus quis fundar sobre Pedro. Que as vossas vidas, fortes na fé, sempre possam irradiar o amor de Deus, e as suas bênçãos desçam abundantes sobre vós e vossas famílias!

© Copyright 2006 – Libreria Editrice Vaticana

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