Categoria: Apologética

Os Adventistas do sétimo dia e o “Juízo Investigativo”

Autor: José Miguel Arráiz
Fonte: http://www.apologeticacatolica.org
Tradução: Carlos Martins Nabeto

O dia 22 de outubro de 1844 é componente importante da doutrina escatológica dos Adventistas do Sétimo Dia, já que primeiramente assinalava a data profetizada para a segunda vinda de Cristo e, posteriormente, o início de um evento transcendental para eles: o “Juízo Investigativo”. A chave dessa data encontraria-se oculta no capítulo 8 de Daniel:

Daniel 8:
1. “No terceiro ano do reinado do rei Baltazar, eu, Daniel, tive uma visão após outra, tida anteriormente.
2. Olhei durante a visão e me vi em Susa, a praça forte que encontra-se na província de Elam; olhei na visão e encontrava-me na porta do Ulai.
3. Levantei os olhos para ver e vi um carneiro que estava diante da porta. Tinha dois chifres. Os dois chifres eram altos, porém um era mais do que o outro e o mais alto tinha despontado o último.
4. Vi que o carneiro acometia contra o Oeste, o Norte e o Sul. Nenhuma fera podia resistir-lhe; nada podia escapar ao seu poder. Fazia o que queria e assim se fez grande.
5. Eu estava refletindo e eis que um cabrito veio do Ocidente, percorrendo toda a terra sem tocar o solo. Este cabrito possuía um chifre ‘magnífico’ entre os olhos.
6. Vendo o carneiro de dois chifres que eu havia visto de pé diante da porta, correu até ele com todo o ardor da sua força.
7. Vi como alcançava o carneiro, enfurecido contra ele; atacou o carneiro e lhe quebrou os dois cornos sem que o carneiro tivesse forças para resistir-lhe. Lançou-o por terra e pisoteou-o. Não havia ninguém que libertasse o carneiro de sua mão.
8. O cabrito tornou-se muito grande, mas quando estava na plenitude do seu poder, o grande chifre quebrou e, em seu lugar, despontaram quatro ‘magníficos’ na direção dos quatro ventos do céu.
9. De um deles saiu um chifre, pequeno, que cresceu muito em direção ao Sul, do Oriente e da terra do esplendor.
10. Cresceu até o exército celeste e lançou na terra uma parte do exército e das estrelas, pisoteando-os com seus pés.
11. Chegou, inclusive, até o Chefe do exército, aboliu o sacrifício perpétuo e sacudiu o cimento de seu santuário
12. e ao exército; no lugar do sacrifício colocou a iniquidade e lançou por terra a verdade. Assim agiu e alcançou êxito.
13. Ouvi, então, um santo que falava e outro santo que dizia ao que falava: ‘Até quando a visão: o sacrifício perpétuo, a iniquidade desoladora, o santuário e o exército serão pisoteados?’
14. Respondeu-lhe: ‘Até duas mil e trezentas tardes e manhãs; depois o santuário será reivindicado’.
15. Enquanto eu, Daniel, contemplava esta visão e tentava compreendê-la, vi imediatamente diante de mim como que uma aparência de homem
16. e ouvi uma voz de homem sobre o Ulai, que gritava: ‘Gabriel, explica-lhe esta visão’.
17. Ele se aproximou do lugar onde eu estava e, quando chegou, fiquei com medo e caí de bruços. Disse-me: ‘Filho de homem, entende: a visão refere-se ao tempo do fim’.
18. Enquanto ele me falava, eu me desvaneci, com o rosto em terra. Ele me tocou e me fez perceber onde estava.
19. Depois, disse: ‘Olha, vou manifestar-lhe o que ocorrerá no fim da ira, porque o fim está fixado.
20. O carneiro que viste, seus dois chifres, são os reis dos medos e dos persas.
21. O cabrito peludo é o rei de Javan; o chifre grande entre os seus olhos é o primeiro rei.
22. O chifre quebrado e os quatro chifres que despontaram em seu lugar são os quatro reinos saídos da sua nação, mas que não terão sua força.
23. E ao fim de seu reinado, quando os pecados atingirem ao grau máximo, surgirá um rei insolente e hábil para enganar.
24. Sua força se tornará poderosa, mas não por sua própria força; tramará coisas inauditas, prosperará em seus empreendimentos, destruirá poderosos e o povo dos santos.
25. E, por sua habilidade, o engano triunfará em suas mãos. Se exaltará em seu coração e, surpreendentemente, destruirá a muitos. Se levantará contra o Príncipe dos príncipes mas, sem que mão alguma intervenha, será destruído.
26. É verdadeira a visão das tardes e manhãs que foi dita, mas tu guardarás em segredo a visão, pois haverá ainda para muitos dias’.
27. Eu, Daniel, desmaiei e fiquei doente durante alguns dias. Depois me levantei para ocupar-me dos assuntos do rei. Permanecia perplexo por causa da visão, que não era possível compreender”.

A interpretação [dos adventistas] parte especificamente dos versículos 13 e 14, onde se diz que o tempo em que o santuário será pisoteado será de “duas mil e trezentas tardes e manhãs” que, para eles, simboliza 2300 anos, contados desde o momento em que saiu o edito para se reedificar Jerusalém (ao que atribuem o ano 457 a.C.). Assim, somando eles 2300 anos a 457 a.C. obtêm o ano 1844.

Pois bem, alguém poderia perguntar: com base em quê eles concluem que estes 2300 anos começam a partir do edito para a reedificação de Jerusalém? A razão é que supõem que como no capítulo 8 de Daniel não se especifica o ponto de partida dos 2300 anos, o anjo Gabriel acaba oferecendo uma explicação um pouco mais adiante, no capítulo 9, versículo 25: “Entende e compreende: desde o momento em que saiu a ordem para reconstruir Jerusalém, até [a chegada do] príncipe Messias, sete semanas e sessenta e duas semanas, praça e fosso serão reconstruídos, mas na angústia dos tempos”.

Como em 1844 não ocorreu a parusia e começaram as deserções que ficaram conhecidas como “o grande desapontamento”, Ellen G. White procedeu ajustes à doutrina pregada pelo fundador do movimento[1] e explicou que este não se equivocara totalmente: o que teria ocorrido nesse dia fora o início do “juízo investigativo”, pelo qual Deus examinará as vidas de todas as pessoas que creram em Jesus, para julgá-las[2].

PROBLEMAS DA EISEGESE ADVENTISTA

A eisegese adventista conta com inúmeros problemas, entre os quais poderíamos mencionar:

1) É uma interpretação fora do contexto. A profecia não faz nenhuma referência ao segundo advento do Messias e tampouco faz menção a algum “juízo investigativo”. Eles entenderam isso porque no versículo 17 menciona-se o “tempo de fim”, no qual será “reivindicado o santuário”. Porém, no versículo 19 se esclarece que isto se refere ao “fim da ira”, expressão que não tem por que se entender daquela outra maneira, como veremos mais adiante.

2) Que o fato de que em alguns textos bíblicos os dias simbolizarem anos[3] não quer dizer que se deva necessariamente aplicar esse critério a toda profecia. Costumeiramente, quando se emprega a palavra “dias” de maneira alegórica, o próprio texto indica que assim se deva entender.
Eles adotam o princípio de “1 dia é igual a 1 ano” a partir de textos como Números 14,34 ou Ezequiel 4,6, que estão em um contexto totalmente diferente:

Números 14,34: “Segundo o número de dias que levastes para explorar o país – 40 dias – suportareis 40 anos com vossos pecados, um ano para cada dia. Assim sabereis o que é afastar-se de Mim” – Aqui Deus castiga o povo com 1 ano para cada dia de desobediência, mas disto não se pode tirar um princípio de que em cada texto profético deva-se assumir a equivalência de 1 dia para cada ano.

O mesmo se dá em Ezequiel 4,6: o profeta se encostará do lado direito por 40 dias, em penitência pelos pecados do povo cometidos durante 40 anos:

“Quando tiverdes terminado estes últimos, te encostarás novamente do lado direito e carregarás a culpa da Casa de Judá durante 40 dias (…) Eu te impus 1 dia para cada ano”.

Ao contrário, em Daniel 8,14 há uma ausência absoluta de qualquer menção de que a expressão “tardes e manhãs” deva ser entendida como anos, expressão que denota a sucessão de dias e noites.

Eis que temos, então, duas suposições dos adventistas:

a) Que a expressão “tardes e manhãs” equivale a “dias”; e

b) Que se deve entender aí que 1 dia significa simbolicamente 1 ano.

3) Tampouco existe algo no capítulo 8 de Daniel que indique que esses 2300 dias (que entendem como anos) devam ser contados a partir do edito para a reedificação de Jerusalém. No capítulo 9 de Daniel, o anjo explica uma profecia diferente e não há razão alguma para assumirmos que ambas [as profecias] tenham o mesmo ponto de partida.

4) A explicação que o próprio anjo Gabriel oferece a Daniel nos versículos 20 a 25 é bastante clara e não concorda com a eisegese adventista, mas com a exegese tradicional da Igreja ao longo da História.

EXEGESE ORTODOXA E TRADICIONAL

Uma correta explicação do capítulo 8 de Daniel é fornecida por São Jerônimo, a qual poderíamos resumir da seguinte maneira:

O carneiro de dois chifres, sendo um chifre mais alto que o outro (v.3) representa o Império Persa: nenhum povo podia resistir a este Império; o próprio Daniel identifica este em sua explicação da profecia[4]:

“[Daniel] dá o nome de carneiro a Dario, o tio-avô de Ciro, que sucedeu no trono dos Medos ao seu pai Astiages. Por outro lado, o chifre mais alto que o outro e que tinha brotado depois representa o próprio Ciro, rei dos Medos e Persas após Astiages, seu avô materno, junto com seu tio materno Dario, que em grego recebe o nome de Ciaxares”[5].

O cabrito com um chifre grande representa Alexandre Magno: este obteve a total vitória sobre o Império Persa derrotando primeiro ao rei Dario Dodomano, conquistando depois o Egito, derrotando em Arbela as sobras do Império Persa no ano 331 a.C.:

“Este cabrito, que vinha do Ocidente e que devido à grande velocidade com que avançava parecia não tocar o solo, é Alexandre, rei dos Gregos, que após destruir Tebas, tomou armas contra os Persas e, após uma primeira batalha nas margens do rio Grânico, venceu aos generais de Dario e atacou diretamente o próprio carneiro, rompendo-lhe seus dois chifres, isto é, os Medos e os Persas, lançando-os aos seus pés, submetendo os dois chifres ao seu poder”[6].

– A morte de Alexandre Magno é representada pela quebra do chifre grande: em razão disto, surgem 4 reinos que se formaram do desmembramento de seu Império e que são simbolizados pelos 4 chifres que surgem depois que o chifre grande se quebra:

“O chifre grande é o primeiro rei, Alexandre; uma vez morto na Babilônia, quando contava 32 anos, surgiram em seu lugar 4 generais, que dividiram o Império entre eles: Ptolomeu, filho de Lago, obteve o Egito; Filipe da Macedônia, conhecido também como Arideu, irmão de Alexandre, obteve a Síria e a Babilônia; Seleuco Nicanor, todos os reinos do Oriente; na Ásia, reinou Antígono. Porém, não tinham a sua força; Daniel [8,22] diz: ‘nenhum, com efeito, pôde igualar a grandeza de Alexandre'”.

O chifre pequeno, que aboliu o sacrifício perpétuo, simboliza Antíoco Epifanes:

“‘E no fim dos anos, na Síria, surgirá um rei insolente e hábil em enganar’: Antíoco Epifanes, filho de Seleuco, que também recebeu o nome de Filopator, após ter sido refém em Roma e, sem que o Senado o soubesse, ter-se apoderado do império mediante fraude, enfrentou a Ptolomeu Filometor, isto é, o “meio-dia” e os egípcios[7]; e depois, o Oriente[8], contra aqueles que preparavam levantes na Pésia; finalmente, enfrentou ou judeus e, após tomar a Judeia, entrou em Jerusalém e erigiu uma estátua a Júpiter Olímpico no Templo de Deus[9]. E ‘até o exército do céu’, isto é, os filhos de Israel, protegidos pelos anjos, ‘chegou sua magnificência'[10], de modo que submeteu muitos santos à idolatria e os colocou sob seus pés como se fossem ‘estrelas do céu'[11]; e tudo ocorreu de modo que submeteu ao seu Império o meio-dia e o Oriente, isto é, o Egito e a Pérsia. E quando diz: ‘E se equiparou, inclusive, ao chefe do exército'[12], significa que se levantou contra Deus e perseguiu os seus santos, além de ter abolido o sacrifício perpétuo que se oferecia pela manhã e pela tarde; ‘e contaminou e sacudiu o cimento do santuário'[13]: isto ele não conseguiu graças ao seu valor, mas graças aos pecados do povo. Assim, a verdade foi lançada à terra; e enquanto florescia o culto aos ídolos, se reduzia o respeito a Deus”[15].

As duas mil e trezentas tardes e manhãs correspondem ao tempo que duraria a profanação do Templo: tempo no qual também foi abolido os sacrifícios no Templo:

“‘Até quando a visão será pisoteada: o sacrifício perpétuo, o pecado da desolação que se tem cometido, o santuário e o exército?'[16]. Um anjo perguntou a outro anjo ‘até quando’, por sentença de Deus e sob o reinado de Antíoco na Síria, o Templo ficará desolado e até quando permanecerá a estátua de Júpiter no Templo de Deus. E respondeu-lhe [o outro anjo]: ‘Até duas mil e trezentas tardes e manhãs; após, purificará o santuário'[17]. Leiamos os livros dos Macabeus e a história de Josefo e ali encontraremos escrito que 143 anos depois de Seleuco, que foi o primeiro rei da Síria após Alexandre, Antíoco entrou em Jerusalém e a devastou completamente; três anos depois voltou e colocou no Templo uma estátua de Júpiter. E até Judas Macabeu, isto é, até 148 anos depois, durante os 6 anos que durou a devastação de Jerusalém e os 3 meses em que o Templo foi corrompido, transcorreram-se 2300 dias e 3 meses, findo os quais o Templo foi purificado[18]. E quando se acrescenta que se ‘purificará o santuário’, faz referência à época de Judas Macabeu que, com o apoio dos irmãos e parentes da aldeia de Modim e muitos outros judeus, venceu os generais de Antíoco junto a Emaús, conhecida agora pelo nome de Nicópolis[19]. Ao ouvir isto, Antíoco, que havia se levantado contra ‘o Príncipe dos príncipes’, isto é, ‘o Senhor dos poderosos’ e ‘Rei dos reis'[20], e se encontrava em Elimais, província da Pérsia, com a intenção de espoliar o templo de Diana, que continha valiosos tesouros, ali mesmo pereceu sem qualquer violência, isto é, morreu doente e de tristeza”[21].

Eis aí uma explicação não somente muito mais racional como também cumprida cabalmente, podendo ser verificada na História.

DOUTRINA ADVENTISTA COMPROMETIDA

Mas não é assim que ocorre com as interpretações adventistas, baseadas em suposições, eisegeses e textos fora do contexto, que foram aceitas pelos crentes em razão da “profetiza” Ellen G. White as apoiar com base em “revelações privadas”, às quais atribuía origem divina.
O “juízo investigativo” não foi nada mais que o recurso ao qual os adventistas recorreram para justificar sua grande desilusão ao invés de reconhecer seu erro; porém, é um recurso que já caducou, mais difícil de se sustentar a cada dia que passa, pois já entre eles mesmos começam a se perguntar como pode ser possível que esse juízo, nunca mencionado em qualquer parte das Escrituras, dure já 167 anos, considerando que Deus é onisciente e tudo sabe. Alguns se conformam com a desculpa dada por seus líderes: Deus demora porque é misericordioso e quer oferecer tempo para a conversão…

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NOTAS
[1] William Miller.
[2] Na Bíblia, há referências ao juízo particular de cada crente após a morte (Hebreus 9,27) e do juízo final (Mateus 24,30-31; Apocalipse 20,11-14), mas não há qualquer menção a um “juízo investigativo”.
[3] Números 14,34; Ezequiel 4,6.
[4] Daniel 8,20.
[5] Obras Completas de São Jerônimo, Edição Bilíngue. BAC 662, Madri, 2006, Tomo V-b, p. 644.
[6] Idem, pp. 644-645.
[7] 1Macabeus 1,19-20.
[8] Daniel 8,9
[9] 1Macabeus 1,21-28.43-57; 2Macabeus 5,11-26; 6,1-7.
[10] Daniel 8,10.
[11] 1Macabeus 1,30-42.58-67; 2Macabeus 5,24-27; 6,8-7.42.
[12] Daniel 8,11
[13] Passagem de interpretação controvertida. Talvez aluda aos atos sacrílegos ocorridos em 25 de dezembro de 167 a.C., cf. C.G.OZANE, “Três Problemas Textuais em Daniel 8,12; 9,26; 11,18”. JthSt 16, 1965, pp. 445-448.
[14] Daniel 8,12.
[15] Obras Completas de São Jerônimo, Edição Bilíngue. BAC 662, Madri, 2006, Tomo V-b, p. 645.
[16] Daniel 8,14.
[17] Idem.
[18] Obras Completas de São Jerônimo, Edição Bilíngue. BAC 662, Madri, 2006, Tomo V-b, p. 647.
[19] 1Macabeus 4,3-25; 2Macabeu 8,1-36; FLÁVIO JOSEFO, Antiguidades dos Judeus 12,7,304 (298-312).
[20] Daniel 8,25; 11,36.
[21] Daniel 8,25; 1Macabeus 6,9-16; 2Macabeus 9,5-10.28; FLÁVIO JOSEFO, Antiguidades dos Judeus 12,9,1 (354.358).

Três casos: Galileu, Lavoisier e Duhem

Autor: Mariano Artigas
Fonte: http://www.arvo.net
Tradução: Carlos Martins Nabeto

Às vezes, os ataques contra a Igreja provêm da presumida oposição entre Religião e Ciência. Por isso, é interessante considerar alguns dados a respeito.

Todo mundo já ouviu falar do “caso Galileu”, quase sempre de maneira deturpada. Porém, poucos sabem que Lavoisier, um dos fundadores da Química, foi guilhotinado pela Revolução Francesa. E quase ninguém sabe nada acerca de Pierre Duhem, físico importante, autor de uma monumental obra sobre História e Filosofia da Ciência. Tudo isto porque, quando se fala de “Ciência e Fé”, passa pela cabeça de muitos apenas duas palavras: “oposição” e “Galileu”. Poucos pensam em “colaboração” e ninguém [pensa] em Duhem. É lastimável!

Quando abordo Galileu em minhas aulas e palestras, costumo recordar que o sábio italiano faleceu de morte natural quando tinha 78 anos. Seguramente, muitos ouvintes pensam que Galileu foi queimado pela Inquisição. Quase sempre, ao encerrar, alguns me dizem: “É verdade? Eu pensava que Galileu tinha sido queimado”.

Me chamou especialmente a atenção o que ocorreu em janeiro de 1992: veio até mim um sacerdote que havia assistido à minha palestra. Estava indignado e com toda razão… Estávamos em Roma, onde ele trabalhava em sua tese de doutorado em Teologia e perguntou-me: “Como se explica que uma pessoa como eu, que sou sacerdote católico há vários anos e que estudou em um Seminário e em uma Pontifícia Universidade, fique sabendo só agora que não mataram Galileu?” E acrescentou: “Há alguns dias, um colega da minha residência esteve visitando o Palácio do Quirinal e nos contou que o guia, em certo momento da visita, apontou para um balcão bem visível e disse: ‘Foi daquele balcão que o Papa apontou o dedo polegar para baixo, para condenar Galileu à morte'”.

A FOGUEIRA QUE NÃO EXISTIU

Como se explica tudo isso? Não sei! É muito estranho. A verdade é que Galileu nasceu na 3ª-feira, 15 de fevereiro de 1564, e morreu na 4ª-feira, 8 de janeiro de 1642, em sua casa, na vila de Arcetri, próxima de Florença. Seu discípulo Viviani, que permaneceu continuamente junto a ele nos últimos trinta meses, relata que a sua saúde estava bem esgotada: possuía uma grave artrite desde os 30 anos, a que se unia “uma irritação constante e quase insuportável nas pálpebras” e “outros males que uma idade avançada traz consigo, sobretudo quando a pessoa tem se consumido muito em estudo e vigília”. Acrescenta ainda que, apesar de tudo, continuava cheio de projetos de trabalho até que, por fim, “uma febre o tomou e foi-lhe consumindo lentamente, com uma forte palpitação que ao longo de dois meses o extenuou cada vez mais, até que, finalmente, em uma 4ª-feira, 8 de janeiro de 1642, por volta das 4 horas da madrugada, morreu com firmeza filosófica e cristã, aos 77 anos de idade, 10 meses e 20 dias”.

Em 1633, ocorreu em Roma o famoso processo contra Galileu. Não foi condenado à morte, nem ninguém queria isso. Ninguém o torturou, nem o segurou, nem tocou-lhe sequer um dedo; não ocorreu nenhuma espécie de maus tratos físicos. Foi condenado à prisão mas, considerando suas boas disposições, a pena foi imediatamente comutada por prisão domiciliar. Desde o processo até a sua morte, viveu em casa; continuou trabalhando intensamente e publicou nesse período sua obra mais importante.

Três dos dez altos dignatários do Tribunal se recusaram a assinar a sentença. O Papa nada teve a ver oficialmente nem com o Tribunal, nem com a sentença. Para mim, lamentavelmente, desde logo o processo não deveria ter se produzido. Porém, os trabalhos de Galileu seguiram adiante.

Com efeito, já se passaram 350 anos desde a morte natural de Galileu. Concordo então com o meu ouvinte de Roma: parece mentira que, a estas alturas, quase todo mundo, inclusive clérigos católicos, estejam seriamente equivocados sobre importantes aspectos de um caso que é sempre usado para atacar a Igreja e para afirmar, como se fosse um fato histórico, que a religião em geral e a Igreja Católica em particular sempre foram contrárias ao progresso científico.

UMA GRANDE CABEÇA GUILHOTINADA

Ao contrário, quem sabe alguma coisa sobre o “caso Lavoisier”, que teve sorte bastante pior que Galileu?

Antoine Laurent Lavoisier, nascido em 26 de agosto de 1743, em Paris, realizou muitos trabalhos científicos importantes. Na Academia de Ciências foram publicados mais de 60 comunicados seus. Foi um dos principais protagonistas da revolução científica que levou à consolidação da Química, razão pela qual é frequentemente considerado como “Pai” da Química moderna.

Seu grande pecado consistiu em trabalhar na cobrança de tributos. Por esse motivo, foi preso em 1793. Personagens importantes fizeram tudo o que podiam para salvá-lo. Parece que Halle expôs ao Tribunal todos os trabalhos feitos por Lavoisier (e diz-se que, a seguir, o presidente do Tribunal pronunciou a célebre frase: “A República não precisa de sábios”). Lavoisier foi guilhotinado em 8 de maio de 1794, quando contava com 51 anos. Joseph Louis Lagrange, famoso matemático cujo sobrenome é bastante conhecido por todos os matemáticos e físicos, disse no dia seguinte: “Bastou um [pequeno] instante para cortarem-lhe a cabeça. Passarão 100 anos antes que nasça outra [cabeça] igual”.

Evidentemente, Lavoisier não foi guilhotinado pela fé. E não estou me empenhando em atacar a Revolução [Francesa], nem a República, nem a ninguém. Simplesmente fico muito surpreso que exista tanta desproporção no que diz respeito ao que chega à opinião pública sobre os casos Galileu e Lavoisier.

Mas nesta vida ocorrem curiosas coincidências. Quando eu acabara de escrever o parágrafo acima, um amigo procurou-me, professor de Biologia e bom católico. Falamos sobre o que eu estava escrevendo e disse-me que um colega seu, de outro país, havia comentado pouco tempo antes: “Você é biólogo e, ainda por cima, católico? Que coisa rara! Você é o primeiro caso que eu conheço!”.

Esse fato acaba sendo “a cereja do bolo”. É um pouco estranho, mas real. Provavelmente, por razões que os historiadores e sociólogos poderiam investigar, durante muito tempo se tem pensado, em muitos ambientes, que a Ciência e a Religião se opõem. Mas a verdade é que isso não é verdade! Os grandes pioneiros da Ciência Moderna eram cristãos. Galileu sempre foi católico. Entre os cientistas de todas as épocas, não poucos são cristãos convictos. Atualmente, os cientistas não-crentes costumam reconhecer que o seu agnosticismo nada tem a ver com a Ciência e que inexiste qualquer dificuldade objetiva para se ser bom cientista e também bom cristão.

DUHEM: FÍSICO, FILÓSOFO, HISTORIADOR E… CATÓLICO

Isto nos leva ao “caso Duhem”: trata-se de um personagem bastante conhecido, ainda que nem sempre bem interpretado no âmbito da Filosofia da Ciência, e totalmente desconhecido para a opinião pública. No entanto, vale a pena saber o que ele fez.

Pierre Duhem foi um físico francês de notável intelectualidade. Nasceu em 1861 e morreu em 1916. A relação de seus artigos e obras ocupa 17 páginas de um livro de tamanho considerável. Escreveu muito sobre temas científicos bem especializados e ainda se ocupou da Filosofia e História da Ciência. Algumas de suas obras são livros em vários volumes e uma delas possui 10 volumes de 500 páginas cada um. Sem dúvida, foi um dos físicos mais importantes de sua época. Foi também católico convicto e levou uma vida realmente exemplar em todos os aspectos.

Pelo que eu saiba, nenhuma obra de Duhem,  ao menos as mais importantes, foi traduzida para a nossa língua. Existem, ao contrário, algumas traduzidas para outros idiomas, inclusive uma delas, “A Teoria Física”, foi traduzida para o alemão dois anos depois de seu surgimento, com um prefácio bastante favorável redigido por Ernst Mach, outro importante físico-filósofo cujas ideias pouco tinham de católicas.

A ORIGEM DA CIÊNCIA MODERNA

Duhem é o pioneiro dos estudos históricos acerca da Ciência Medieval, tema que possui uma importância cada vez maior na atualidade. Este é o aspecto em que vou me deter agora.

Duhem era um trabalhador incansável que, apesar de sua grande competência, não chegou a ser professor em Paris, talvez em razão de obstáculos ideológicos. Isto, porém, permitiu que trabalhasse muito por conta própria. Estava interessado na História da Ciência e pôs-se a investigar o passado. Surpreso, foi encontrando nos arquivos franceses muitos manuscritos antigos jamais publicados, que lançavam novas luzes sobre o nascimento da Ciência Moderna.

Segundo o clichê geralmente admitido, a Ciência Moderna parecia ter nascido no século XVII, praticamente a partir do nada. A Idade Média teria sido uma época obscurantista, dominada pela Teologia e inimiga da Ciência. O nascimento da Ciência Moderna teria se produzido apenas quando o livre pensamento se emancipou da Igreja e da Teologia. Pois bem: Duhem encontrou abundantíssima documentação que desfazia esse mito e foi publicando, comentando-a nos dez grandes tomos de sua obra “O Sistema do Mundo”.

Para compreender a situação, convém considerarmos que não existia imprensa até o século XVI. As obras anteriores e, portanto, as obras medievais, eram manuscritas. Quando a imprensa foi descoberta, muitos manuscritos foram relegados ao esquecimento nos arquivos. Os pioneiros da “Nova Ciência” não se preocuparam em apontar as suas dívidas intelectuais para com os autores anteriores e preferiram mais sublinhar a “novidade” dos seus trabalhos. A Idade Média caiu assim na penumbra.

Duhem trabalhou diretamente com muitos manuscritos medievais inéditos. Seu trabalho o levou a convencer-se de que a Idade Média – especialmente na Universidade de Paris, bem como na de Oxford e outros centros intelectuais – foi uma época em que, paulatinamente, se foram desenvolvendo os conceitos que permitiram o nascimento sistemático da Ciência Experimental Moderna no século XVII.

A MATRIZ CULTURAL CRISTÃ

Os trabalhos de Duhem abriram um enorme campo de pesquisa, que foi continuado por importantes historiadores de toda espécie de ideologias e países.

Um deles é Stanley Jaki. Nascido em 1924 na Hungria, estabeleceu-se nos Estados Unidos em 1951. É doutor em Física e Teologia, professor da Universidade Seton Hall, Nova Jérsei. Foi convidado a ministrar cursos nas Universidades de Edimburgo, Oxford, Princeton, Sidney e muitas outras em todo o mundo. Publicou cerca de 30 livros sobre as relações entre a Ciência e a Filosofia e Cultura. Em 1987, recebeu das mãos do príncipe Felipe da Grã-Bretanha o prêmio “Templeton”, em reconhecimento das suas publicações.

Jaki escreveu a primeira grande biografia sobre Pierre Duhem, publicada em 1984 pela Editora Nijhoff de La Haya. Continuou e ampliou os trabalhos de Duhem sobre o nascimento da Ciência Moderna e suas relações com a Religião.

Jaki afirma que nas grandes culturas da Antiguidade (Babilônia, Egito, Grécia, Roma, Índia, China etc.), a Ciência Experimental não encontrou um terreno propício. Isto é, as raras tentativas de “nascimento” resultaram em sucessivos “abortos”. Um fator determinante foi que nessas culturas a natureza era representada como submissa a certas divindades caprichosas, ou era imaginada de maneira panteísta. Jaki examina esses problemas a partir do ponto de vista histórico e conclui que o nascimento da Ciência Moderna só foi possível na Europa cristã, quando ocorreu o que denomina de “matriz cultural cristã”.

Essa matriz cultural incluía a crença em um Deus pessoal Criador, que criou livremente o mundo. E porque a Criação é livre, o mundo é contingente e apenas podemos conhecê-lo se o estudarmos com o auxílio da observação e experimentação. Como Deus é infinitamente sábio, o mundo é racional e segue leis. Como afirma repetidamente a Revelação cristã, o mundo está repleto de ordem. Porque Deus criou o homem à sua imagem e semelhança, o homem participa da inteligência divina e é capaz de conhecer o mundo.

De fato, é fácil comprovar que os grandes pioneiros da Ciência Moderna compartilhavam destas convicções, que possuíam porque eram cristãos e viviam dentro de uma matriz cultural cristã; e, em alguns casos, eles mesmos afirmaram a importância que estas ideias tinham para o seu trabalho científico.

Por exemplo: Kepler fez muitas tentativas, durante anos, até que encontrou suas famosas leis, convencido de que deveriam existir em um universo criado pela Sabedoria divina e que deveriam concordar com os dados observacionais estabelecidos pelo astrônomo danês Tycho Brahe.

Logicamente, não basta ser cristão para se fazer Ciência; Ciência se faz com matemática e experiências. Contudo, a Ciência Moderna nasceu e se desenvolveu durante séculos em um Ocidente cristão, que lhe proporcionou uma matriz adequada.

Compreendo que estas afirmações possam fazer que alguns estranhem, afinal as obras de Duhem, de Jaki e de outros autores semelhantes não costumam a ser traduzidas para o nosso idioma. Ademais, durante muito tempo se tem apresentado a Ciência como se estivesse em perpétua luta contra a Religião, mesmo que isto não condiga com a realidade. Porém, se a Ciência nos ensina algo é que devemos nos ater aos fatos e superar os boatos.
O COMPROMISSO PESSOAL

Chegamos, por fim, a uma terceira diferença entre a Fé e a Razão: concretamente, as verdades da Fé Cristã comprometem seriamente a vida pessoal, o modo de se comportar.

Talvez esta seja a principal dificuldade que experimentamos diante das verdades da fé. O Cristianismo não é uma simples teoria, mas algo que afeta diretamente a vida.

Os primeiros cristãos, que viviam em um mundo pagão, quando se convertiam ao Cristianismo viam-se obrigados a mudar não poucos de seus costumes. E assim o faziam.

Não é de se estranhar que atualmente ocorra algo semelhante. Na verdade, sempre foi assim. Ser bom cristão sempre supõe um esforço sério. Não é compatível com uma vida fácil. Exige agir com consciência e, frequentemente, “nadar contra a corrente”. Jesus Cristo nos advertiu disto com grande clareza e em diversas ocasiões. Contudo, continua sendo certo o que Ele prometeu: quem perder a sua vida por amá-Lo, a encontrará; e quem o seguir de perto obterá 100 por 1 nesta vida e também, depois, a vida eterna.

O amor autêntico, a retidão dos corações e a generosidade carregam consigo certos sacrifícios; porém, obtêm-se bens muito maiores, que são os únicos que preenchem realmente a vida humana. O profundo conhecimento da Fé Cristã reserva muitas surpresas agradáveis. E não é assim tão difícil: se dedicássemos a esse assunto um pouco do esforço que naturalmente dispensamos a muitas coisas que têm uma importância muito menor, comprovaríamos que vale a pena de verdade!

O texto de Mateus 16 é autêntico?

Autor: Pe. Miguel Ángel Fuentes
Fonte: http://www.teologoresponde.com.ar/
Tradução: Carlos Martins Nabeto

[Quanto a isso,] tenho me expressado de vários modos, por exemplo:

“Estimado irmão em Cristo: Folheando um antigo tratado de religião, li um trecho que dizia que muitas seitas ou ‘igrejas’ acreditam que os versículos 18 e 19 do capítulo 16 do Evangelho de Mateus foi um acréscimo posterior para justificar o poder do Papa e da Igreja Católica. O que há de certo nisso? Faz parte do manuscrito original? Pode ter havido alguma modificação em algum dos Evangelhos e justo neste em especial?”

Os especialistas em Sagradas Escrituras têm estudado muito esse tema. Para responder a esta consulta, me baseio no que apontam Leal, Del Páramo e Alonso, em seu comentário a esta passagem[1]. Tem havido aqueles que afirmaram que os versículos 17 a 19 do capítulo 16 de Mateus foram interpolados no Evangelho em fins do século II, ou entre os anos 110 a 120, ou ainda no tempo de Adriano (117-138), pela Igreja romana. Harnack acredita que apenas foram interpoladas as palavras “e sobre esta pedra edificarei a minha Igreja”; o texto original diria: “E as portas do Hades não te vencerão”, por cujas palavras se prometia apenas a Pedro – unicamente – a imortalidade (segundo esse autor). Porém, estas afirmações são contrárias a todos os códices e antiquíssimas versões, dos autores mais antigos da Cristandade, que unanimemente leem o texto como a Igreja sempre leu. Por outro lado, o colorido semítico bem marcado que esses versículos apresentam não pode ter uma origem romana, conforme afirmam esses críticos.

Outros autores não têm dificuldade em admitir que essas palavras foram efetivamente escritas por São Mateus, mas pretendem que não foram ditas por Cristo. Refletiriam, ao contrário, o conceito que a Igreja primitiva de Jerusalém já fazia de São Pedro e sua relação com a Igreja. Efetivamente, Pedro, como primeira testemunha do Cristo ressuscitado (cf. 1Coríntios 15,5) e como primeiro pregador da ressurreição (cf. Atos 2,14ss), teve, desde o princípio, na mente dos primeiros cristãos, um lugar privilegiado e foi considerado chefe de toda a comunidade. Este conceito – dizem esses autores – teria sido deixado por São Mateus, colocando na boca de Cristo as palavras dirigidas a São Pedro nessa seção.

Esta teoria que, como vemos, acaba por questionar a probidade e fidelidade histórica de Mateus, fundamenta-se em princípios apriorísticos e hipóteses arbitrárias, tal como, principalmente, supor gratuitamente uma evolução dos atos e palavras de Cristo ao fim de uns tantos anos, isto é, quando ainda viviam testemunhas oculares dos acontecimentos. Supõe ainda, falsamente, que a origem e o progresso da religião e doutrina cristã foram lançados ao arbítrio da fantasia popular e, finalmente, atira por terra o verdadeiro conceito e valor da Tradição Apostólica. Como quer que seja, os mesmos que sustentam que tal seção foi tardiamente interpolada no Evangelho são obrigados a reconhecer que São Justino, antes do ano 165 (data da sua morte), já a conhecia como pertencente ao episódio de Cesareia[2].

Esta teoria da interpolação está hoje praticamente abandonada, tanto por argumentos externos quanto internos. Externamente, pelo testemunho unânime dos códices, das versões antigas e citações dos Padres; por unanimidade, as fontes em favor da autenticidade não autorizam a alegação de texto interpolado; e quem o afirma, o faz gratuitamente e sem testemunhos antigos que lhe sejam favoráveis. A partir do ponto de vista da crítica interna, fica demonstrado o caráter semítico de várias expressões que se encontram nesses versículos, indicando a origem palestinense da Tradição que preservou esse logion, já que demonstra que foi entregue na língua aramaica antes de ter sido traduzida para o grego. Essas expressões semíticas são:

a) Simon bar Iona;
b) Carne e sangue (expressão semítica para indicar o homem mortal, abandonado às suas próprias forças);
c) Pai… que está nos céus;
d) Tu és Pedro e sobre esta pedra (palavras que em aramaico correspondem-se perfeitamente: “Kefa”…”Kefa”);
e) Chaves do reino dos céus… será desatado nos céus (os judeus usavam esta palavra para evitar [pronunciar] o nome santo de Deus);
f) Atar-desatar (expressão usada pelos rabinos).

Porém, inclusive, deve-se dizer que não se trata apenas de algumas palavras semitas, mas “a própria estrutura da passagem por completo (…) E tão claro é isso que o próprio [biblista protestante] Bultmann diz: ‘Não vejo condições de sua origem ter sido realizada em outra comunidade primitiva, a não ser a de Jerusalém’. Assim, a passagem demonstra que não foi redigida em um ambiente romano, como se pretendia”[3]. Vejamos em maiores detalhes algumas das expressões mais caracteristicamente semitas:

a) O nome de Pedro: duas coisas são ditas sobre o nome do Apóstolo Pedro, que nos indicam a inconfundível autenticidade do texto:

– A primeira é a expressão “Filho de Jonas”, expressão “saborosa”, pois era costume judeu apontar, depois do nome das pessoas, especialmente quando se queria fixar bem a mesma, com precisão e exatidão, o nome de seu pai, expresso pela palavra “ben” (=filho de) ou na forma aramaica empregada aqui “bar” (podemos ver outros exemplos em: Isaías 1,1; Jeremias 1,1; Ezequiel 1,1 etc). Manuel de Tuya[4] aponta que a expressão “bar Yona” (pombo) não era um nome raro em Israel (cf. 2Reis 14,25; Jonas 1,1). Seguindo São Jerônimo, alguns pensaram que a forma “Yona” fosse uma abreviação do nome Yohanan (=João), visto que posteriormente Pedro é chamado de “filho de João” (cf. João 21,15). Porém, os autores semitas não costumam a admitir a abreviação de João, já que tal uso não se verifica; ao contrário, pensam que o nome de João, patronímico de Simão, poderia ser um sobrenome grego escolhido por sua semelhança com o verdadeiro nome hebreu. O fato que aqui nos interessa é o seu forte valor aramaico e, portanto, nos torna possível rejeitar o caráter interpolado ou posterior deste texto; ao contrário, nos faz inclinar a aceitar o seu caráter arcaico e original.

– A segunda expressão é “és pedra”: “Petrus”, em latim; “Petros”, em grego, “Kefa” ou “Kefas”, em aramaico (segundo se translitere). (…) O nome próprio deste filho de Jonas foi “Simão” ou “Simeão”, e assim é transliterado no Novo Testamento em grego. Porém, todos os evangelistas atestam que Jesus lhe aplicou um novo nome, que em grego se escreve “Kefas” ou “Petros” (cf. João 1,42; Lucas 6,14; Mateus 10,2).

No tempo em que Paulo escreveu sua carta aos Gálatas (ano 54) e a primeira aos Coríntios (ano 57), as igrejas paulinas conheceram aquele apóstolo da circuncisão não pelo seu nome próprio (“Simão”, que Paulo nunca usa), mas pelo seu novo nome (“Kefas”, que Paulo quase sempre usa; ou “Petros”, que Paulo usa duas vezes [Gálatas 2,7-8]). Paulo supõe que seus ouvintes conhecem bem quem é este “Kefas” ou “Petros”). Portanto, nas igrejas paulinas, até o ano 55, o uso daquele nome novo de tal modo havia prevalecido, que o nome próprio “Simão” havia sido abandonado.

Contudo, os evangelistas, tratando do príncipe dos Apóstolos, não empregavam o nome “Kefas”: Marcos e Lucas o chamam de “Simão” até o momento da vocação dos Doze (Marcos 3,16; Lucas 6,14), depois disso chamam-no de “Petros”; Mateus o chama “Petros” desde o início; João o chama de “Petros” ou “Simão Petros”; porém, observam que Jesus usa o nome de “Simão” até o fim (p.ex.: Mateus 16,17; 17,25; Marcos 14,37; Lucas 22,31; João 21,15-17). Portanto, quando os evangelistas habitualmente o chamam de “Petros”, evidentemente empregam o nome usado pela Igreja no tempo em que escreveram.

Levando isto em conta, podemos nos perguntar: como se explica o fato de que aquele nome novo (“Kefas” ou “Petros”) prevalecesse tão universalmente na Igreja primitiva, de tal forma que o nome próprio daquele homem (“Simão”) acabou sendo quase esquecido? Não parece que isto se explique adequadamente apenas pelo fato de que o próprio Jesus lhe impôs este nome, já que Jesus também chegou a impor um nome a João e Tiago (“Boanerges”, cf. Marcos 3,17) e este não prevaleceu. Tampouco parece que possa explicar-se por que prevaleceu tão universalmente, a não ser pelo fato de a Igreja ter reconhecido a grande importância que tinha o significado daquele nome e porque esse significado fazia parte da Tradição querigmática: consideremos que nem “Kefas” nem “Petros” eram conhecidos como nome masculino antes do uso que lhe dará Cristo ao aplicar-lhe a Simão. É um nome novo, usado pela primeira vez na Igreja cristã. A formação do nome grego “Kefas” a partir da palavra aramaica escrita com caracteres gregos e terminação de gênero masculino demonstra que a Igreja sabia que Jesus aplicou a Simão a voz “Kefa”. Em grego, “petra” é a massa pétrea; “petros” é a pedra. Pois bem: há que se observar que segundo a lei linguística comum, os nomes próprios não se traduzem, mas são transpostos tal qual em outras línguas. Exemplos são os nomes de Jesus, Maria, José e João: todos significam alguma coisa apenas na língua hebraica; no entanto, esses nomes nunca são traduzidos quando recebidos pelas línguas grega, latina ou modernas. Portanto, foi uma exceção à essa regra o fato de que a Igreja não se reteve no nome “Kefas”, mas que o uso sancionou a versão deste nome, isto é, “Petros”. Tal exceção de regra linguística exige uma explicação, a qual não parece ser outra senão a consciência da Igreja quanto ao significado deste nome.

Em suma: a Igreja primitiva não apenas sabia que Jesus tinha imposto este nome a Simão como também conhecia a Tradição que justificava a grande importância dada a este nome. Tais fatos confirmam a historicidade deste logion.

b) “Eu te darei as chaves do reino dos céus”: Esta é outra das metáforas de inconfundível origem palestinense e ambiente bíblico. A expressão “reino dos céus” responde ao uso judaico de se evitar [pronunciar] o santo Nome de Deus, ao que Mateus adere em seu Evangelho: por isso, onde Mateus diz “reino dos céus”, se o texto possui paralelo em outros evangelistas, encontraremos “reino de Deus”. Com efeito, “chaves dos céus” ou “chaves do reino dos céus” é a mesma coisa que “chaves do reino de Deus”. “Reino de Deus”, na boca de Jesus, não significa tão somente aquele domínio absoluto de Deus que se iniciará no Juízo Final, mas que também significa aquele domínio de Deus já exercitado e reconhecido nesta Terra, tanto na pessoa e obras de Cristo quanto na Igreja que Ele mesmo quis fundar.

A metáfora de “dar as chaves” possui amplo uso bíblico e judaico. Exemplo claríssimo desse uso pode-se encontrar em Isaías 22,19-22. Nessa passagem fica claro o sentido da metáfora: aquele que possui as chaves da casa real (porque Davi é rei por excelência) possui verdadeira autoridade sobre os habitantes daquele reino, autoridade essa que exerce como vigário do próprio rei. Strack-Billerbeck propõe muitos exemplos desta imagem na literatura judaica e conclui: “a entrega das chaves significa a entrega do poder de uma cidade”. No Novo Testamento, o próprio Cristo é descrito como o Santo e Verdadeiro que possui a chave de Davi, que abre e ninguém fecha, fecha e ninguém abre (Apocalipse 3,7). Trata-se, incontestavelmente, do exercício da autoridade real.

No texto de Mateus 16,19, Cristo – que possui as chaves de Davi – diz a Pedro: “E te darei as chaves do reino dos céus”. “Dar as chaves” é entregar o poder vicarial. Isto quer dizer que Pedro é constituído “porteiro do céu”, com o poder de permitir ou impedir a entrada no céu? Ou é constituído vigário de Cristo, com autoridade sobre o povo de Deus nesta Terra? A resposta provém da própria noção de poder vicarial: nos céus, o próprio Cristo está presente para reger e não precisa de vigário; ao contrário, na Terra, não está visivelmente presente para reger visivelmente os homens. Esta resposta se confirma pelo contexto imediato desta promessa. Isto porque não são três promessas diferentes, mas uma só promessa sob uma tripla imagem. Na primeira metáfora, vimos que Cristo fala de sua Igreja ou de seu Povo, como de uma casa que será edificada sobre um homem, Pedro. Sem dúvida nenhuma, trata-se da Igreja que será fundada nesta Terra, de forma social, de modo que possa ser edificada sobre um homem visível. Na terceira metáfora, fala-se do poder de Pedro nesta Terra: “tudo o que atares… desatares na Terra”; logo, o poder das chaves será exercido nesta Terra.

c) A metáfora de “atar e desatar”: “E tudo o que atares na Terra será atado no Céu; e tudo o que desatares na Terra, será desatado no Céu”. O sentido desta metáfora indica o poder moral de proibir ou permitir, de excluir ou admitir na comunidade. A universalidade deste poder tem explicação na expressão repetida “tudo o que”. A ratificação divina é expressa pela frase “no céu”, que significa “diante de Deus”.

Resta tratarmos uma questão: podemos dizer que aqui se promete a Pedro a autoridade suprema e universal, já que posteriormente o mesmo poder de atar e desatar será dado aos demais Apóstolos? O contexto nos oferece a resposta: a intenção de Cristo ao empregar a tripla imagem é que cada uma ilumine e esclareça as outras. O poder de atar e desatar explica melhor o poder das chaves, que é entregue apenas a Pedro; e ilumina sua função como única pedra sobre a qual a Igreja será edificada. Portanto, este poder de atar e desatar é prometido agora àquele único homem que será pedra de toda a Igreja, o único que possuirá as chaves do reino. Retamente se conclui que Cristo quis dar-lhe o poder supremo e universal; é então irrelevante que em outro lugar se prometa a todo o Colégio Apostólico o poder de atar e desatar, já que a autoridade suprema e universal que um possui, não exclui uma verdadeira autoridade também participativa pelos demais. O poder supremo não é, por si só, poder único e exclusivo.

O que se deve destacar aqui é a força bíblica dessa expressão: os verbos gregos “deses” (atar)  e “luses” (desatar) traduzem literalmente os verbos hebraicos “asar” e “natar” ou “shera”, em aramaico. Assim, por exemplo, por volta do ano 70 d.C., o rabi Jeconias iniciou sua escola com uma oração em que pedia a Deus “não proibir” (=atar) o que é permitido (=desatado), nem “permitir” (=desatar) o que é proibido (=atado)”[5]

d) “Carne e sangue”: Cristo diz que isto “não te revelou nem a carne e nem o sangue”, expressão bastante frequente na linguagem bíblica, que responde à forma “basar wadam”, com que se expressa nesse caso, com circunlóquio, o homem em seu aspecto de debilidade inerente à sua condição humana, máxime em sua contraposição à Deus. São Paulo, em Gálatas 1,16, também a emprega: “sem pedir conselho nem à carne nem ao sangue”, isto é, a homem nenhum. E em Efésios 6,12: “Nossa luta não é contra a carne e o sangue”, ou seja, não é contra homens.

Portanto, mediante estas imagens, cada qual iluminando e confirmando a outra, Cristo promete a um só Apóstolo – Pedro – a autoridade suprema e universal para reger a Igreja. Notemos que a força do argumento encontra-se principalmente nestas duas razões:

1) No sentido bíblico e judaico dessas imagens – trata-se da mentalidade dos antigos;

2) Na perfeita coerência e mútua confirmação das três imagens no sentido de autoridade vicarial.

Talvez somente a imagem de pedra não tivesse bastado; porém, não está só, mas une-se com a promessa de invicta estabilidade da Igreja assim fundamentada: na promessa das chaves; na promessa do poder de atar e desatar; na promessa de ratificação do exercício desse poder inclusive diante de Deus. A única interpretação admissível é a que explica não apenas uma ou outra imagem, independentes uma das outras, mas a que todas, tomadas conjuntamente, explica e demonstra como concordam entre si. A esta exigência de uma sã exegese, somente a noção de autoridade vicarial satisfaz.

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NOTAS:
[1] Cf. “Sagrada Escritura – Texto e Comentário pelos Professores da Companhia de Jesus”. BAC, 1964, tomo 1, pp. 183-184.
[2] Cf. “Bíblia Comentada pelos Professores de Salamanca”. BAC, 1964
, tomo 2 (Evangelhos), p. 379. O tomo dedicado aos Evangelhos está a cargo de Manuel de Tuya, O.P.
[3] Cf. Tuya, obra citada, p. 380.
[4] Cf. Tuya, obra citada, p. 379.
[5] Strack-Bilerbeck, citado por Tuya, obra citada, p. 378. Cf. Bonsirven, “Textes Rabbiniques”, 1955 nºs 1195, 624, 831, 842, 1984, 423.

Eu só posso orar usando fórmulas pré-estabelecidas e apenas em certas horas e locais?

Autor: This Rock Magazine – Julho/1990
Tradução: Carlos Martins Nabeto
Fonte: Catholic Answers – http://www.catholic.com

– Quando eu era católica, me disseram que eu só podia rezar usando fórmulas pré-estabelecidas, e apenas em certas horas e locais. Agora que eu sou uma cristã nascida de novo, eu posso orar usando as minhas próprias palavras, em qualquer tempo e lugar, mesmo quando estou lavando a louça! (Anônimo)

Parece-nos pouco provável que um padre, freira ou instrutor religioso tenha dito a você: “Reze usando fórmulas pré-estabelecidas, em certas horas e locais”. É bem mais provável que você tenha compreendido errado o que lhe disseram.

Ou será que você concluiu, a partir das orações litúrgicas da Missa e dos livros de orações, que toda oração precisa seguir uma fórmula pré-determinada? Se foi isso o que ocorreu, você foi vítima do raciocínio do “non sequitur”: é falácia lógica concluir que todas as orações tenham palavras padronizadas só porque algumas as possuem.

A Igreja Católica sempre ensinou que você pode usar [nas orações] as suas próprias palavras e em qualquer tempo e lugar. Na verdade, a importância da oração mental como uma atitude constante durante o decorrer do dia é bastante recomendada pelos escritores espirituais católicos, tanto antigos quanto contemporâneos.

Ficamos felizes de saber que você descobriu que pode orar usando suas próprias palavras, mas recordamos que você formou uma falsa impressão de que isto não era possível no Catolicismo e, em razão disto, concluiu que precisava abandonar a Igreja para poder ser capaz de orar enquanto lava a louça.

E por falar em lavar, você já era uma cristã nascida de novo quando católica. Isto, evidentemente, não quer negar a realidade da sua conversão espiritual obtida sob os auspícios protestantes, uma conversão que faz o Cristianismo ser vivo para você. Entretanto, é coisa certa que você nasceu de novo pelo Batismo. É claro que você, como protestante evangélica, pode querer objetar esta afirmação, mas o ensinamento claro da Bíblia seria contrário a você (João 3,3; 5,22; Tito 3,5).

Por que todos estão falando de vampiros?

Por Pe. Robert Barron
Fonte: http://voxfidei.blogspot.com/
Tradução: Carlos Martins Nabeto

É preciso estar no mundo da lua para não perceber a frequência com que os vampiros aparecem na cultura popular atual:

Um dos programas de televisão mais populares dos últimos anos foi “Buffy, a Caça-Vampiros” (Buffy, the Vampire Slayer). O livro de Anne Rice, “Crônicas do Vampiro” (Vampire Chronicles), continua sendo amplamente lido. O canal HBO apresenta atualmente um programa sobre vampiros chamado “True Blood”. Wesley Snipes protagonizou “Blade”, uma série de três longa-metragens sobre vampiros. E um dos filmes de maior sucesso ultimamente é “Crepúsculo” (Twilight): uma história de amor entre adolescentes mortais e vampiros. Como explicar esse interesse permanente nesta matéria?

É óbvio que a astuta apresentação do mercado tem muito a ver com o sucesso desses programas, porém, creio que existam também outras razões. Na ordem espiritual há uma lei, semelhante à lei da conservação de energia, que expresso desta maneira: “quando se suprime o sobrenatural, o ser humano busca expressá-lo de uma forma indireta ou distorcida”. Nos últimos 50 anos, temos presenciado a atenuação da visão bíblica do mundo, que em alguns ambientes foi totalmente suprimida.

Em outras oportunidades, queixei-me do Secularismo entediante e sem graça que simplesmente põe de lado tudo o que é espiritual, o sobrenatural e o transcendente. Esta separação da dimensão religiosa é incentivada pela cultura do consumismo que nos ensina de mil maneiras que o prazer sensual e a riqueza material são as chaves da felicidade. Para a mentalidade secular, Deus é, quando muito, uma força distante e indiferente; Jesus, um guru; e a vida eterna, uma infantil fantasia.

No entanto, pela lei que expressei acima, o sobrenatural não pode ser suprimido. Instintivamente se procura a Deus e um mundo que transcenda o âmbito da experiência comum; somos naturalmente preparados para isso e por isso o nosso desejo – deformado pela cultura que nos cerca – produz uma versão distorcida dessa transcendência, uma espécie de espiritualidade de segunda categoria. É aí que surge na cultura o mundo dos vampiros! Apreciemos uma característica deste universo alternativo:

Longe de beber o sangue das suas vítimas, o que distingue os vampiros é a imortalidade: eles retornam da morte e são eternamente jovens. Embora a ideologia materialista que nos rodeia insista que não somos nada além de animais bastante inteligentes que se dissolvem na morte, no fundo sabemos que somos mais do que isso. Em nós existem – como disse Cleópatra na obra de Shakespeare – “nostalgias imortais”, pois somos ligados – queiramos ou não – ao Deus eterno que existe fora do tempo. Quando se suspende o sentimento religioso da imortalidade, produzimos estas raras alternativas imaginárias, como esses vampiros que não podem morrer. Digo “alternativa” porque a autêntica imortalidade não tem nada a ver com a vida sem fim neste mundo; ao contrário, tem mais a ver com ser transportado para fora do tempo, para o âmbito eterno de Deus. Contudo, quando estamos espiritualmente vazios, a alternativa mórbida do mundo dos vampiros nos fascina.

Há pouco tempo, encontrei uma frase magnífica de Anne Rice, a autora que mencionei acima e que escreveu uma série de novelas que iniciaram toda esta moda de vampiros. Ela dizia que o personagem de Louis, o gênio torturado entrevistado em sua já famosa primeira novela, é uma evocação de muitos amigos que ela teve nas décadas de 1960 e 1970, pessoas mergulhadas na miasma do secularismo pós-cristão. Como o vampiro da estória, não podiam encontrar a saída para a sua situação. A angústia existencial do vampiro de Anne Rice corre em paralelo com a angústia da geração secular, sedenta de todas as coisas que a sua cultura lhes negou. E o que torna a observação de Anne Rice mais fascinante é que ela mesma encontrou o caminho através da miragem secularista de sua geração e chegou, assim, em Cristo. Há apenas 10 anos, Anne Rice reencontrou-se com a vívida imaginação e a profundidade intelectual da fé de sua juventude e, a partir de então, tem dedicado o seu trabalho totalmente ao Senhor. Até agora publicou dois volumes de uma série sobre a vida de Jesus, contada em 1ª pessoa, e seu texto mais recente é o começo de uma nova série de novelas sobre os anjos. Também garantiu que, apesar dos pedidos de muitos dos seus admiradores, nunca mais voltará a escrever outra novela sobre vampiros. O que me resulta fascinante aqui é que quem tornou “chique” os vampiros conseguiu passar desta falsa visão do sobrenatural para adotar com entusiasmo a verdadeira visão.

O Catolicismo de Anne Rice me recorda o Catolicismo que desempenha um papel importante na novela original de Bram Stocker sobre Drácula. Stoker, um irlandês do século XIX, inseriu a sua lenda dentro da narrativa do pecado, da graça e da redenção. No relato de Stoker, Drácula havia amaldiçoado a Deus e caiu em uma condição infernal (o que explica a sua aversão ao Crucifixo). O professor Van Helsing, um cientista e fiel devoto (sim, definitivamente é possível ser ambos!), ajuda o vampiro a encontrar a salvação. Nesta novela, os temas católicos abundam: a Eucaristia, a Missa, a Vida Eterna etc. Com efeito, no final do século XIX era possível encontrar o relato de vampiros dentro do marco da História Cristã. O que encontramos hoje é um triste declínio, onde os contos de vampiros são o pálido substituto de um robusto Cristianismo.

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O Pe. Robert Barron é autor de “Why Is Everyone Crazy About Vampires?” (Por que Todos estão Loucos pelos Vampiros?), publicado pela Catholic New World, de 19.10.2009. Foi ordenado em 1986 pela Arquidiocese de Chicago. Possui Mestrado em Filosofia pela Universidade Católica da América e Doutorado em Teologia pelo Instituto Católico de Paris. É professor de Teologia Sistemática na Universidade de St. Mary of the Lake, Mundelein Seminary. É autor de: “And Now I See: A Theology of Transformation” (Agora eu Enxergo: uma Teologia de Tranformação), “Thomas Aquinas: Spiritual Master” (Tomás de Aquino: Mestre Espiritual), “Heaven in Stone and Glass: Experiencing the Spirituality of the Great Cathedrals” (Paraíso em Pedra e Vidro: experimentando a espiritualidade das grandes catedrais), “Eucharist (Catholic Spirituality for Adults)” (Eucaristia – Espiritualidade Católica para Adultos), “Priority of Christ” (A Prioridade de Cristo), “Toward a Postliberal Catholicism” (Rumo a um Catolicismo Pós-Liberal) e “Word on File: Proclaiming the Power of Christ” (Palavra no Arquivo: Proclamando o Poder de Cristo). Utiliza o seu canal no YouTube para atingir uma maior audiência, oferecendo valiosas lições de uma fé viva pela indicação de coisas que podemos aprender a partir da observação de personagens populares da TV e do cinema.

As profecias Maias relativas a 2012 deveriam nos preocupar?

Autor: Manuel Mondragón L.
Fonte: http://vacunadefe.com
Tradução: Carlos Martins Nabeto

De uns tempos para cá, tem-se propagado a ideia de que em dezembro de 2012 tudo o que conhecemos encontrará o seu fim.

Alguns defendem esta crença baseada nas profecias maias, pois – segundo dizem – em 21 de dezembro desse ano ocorrerão eventos que alterarão o curso da história e da humanidade. Inclusive, diversos filmes fatalistas apresentam imagens do mundo destruído nesse ano, ressaltando que o futuro será devastador, pouco importando a religião, exceto para algumas mentes brilhantes ou passageiros ricos que se salvarão como no relato de Noé. Tudo isto é completamente irreal.

AS PROFECIAS MAIAS

O mítico povo pré-hispânico dos Maias era considerado grande observador do céu. Ostentava maravilhosos discernimentos astronômicos e media o tempo com precisão, não de forma direta mas a partir de lapsos cíclicos, através de diversos sistemas de calendário de impressionante exatidão.

As profecias maias referem-se ao Sexto Ahau (isto é, o Sexto Sol), que em correspondência com o nosso calendário começará em 21 de dezembro de 2012, dando início a um período de 5125 anos. Seus defensores indicam que será um ciclo de sabedoria, harmonia, paz, amor, consciência e supõe o retorno à ordem natural. Tal data corresponde ao solstício de inverno no hemisfério norte e, assim, alguns consideram que sobrevirá o fim do mundo ou o fim dos tempos, embora outros, ao contrário, vislumbrem grandes mudanças no interior e exterior dos seres humanos. Quanta ternura!

Para respaldar suas afirmações, o movimento que crê na convergência dos vaticínios supostamente derivados da cultura maia, bem como os hopis, as culturas hindu, egípcia e chinesa, as que se ajustam com elementos retirados supostamente da Bíblia judaico-cristã ou de doutrinas oriundas de alquimistas, astrólogos e, obviamente – como não poderia faltar – do ultimamente citado Michel de Nostradamus, e ainda alguns irmãos separados e outros que se dizem cientistas, arrematam que em tal data o magnetismo do nosso planeta Terra poderá ser alterado e abaterá sobre ele um gigantesco planeta ou um imenso asteroide, dando lugar a uma acelerada atividade solar sem precedentes, além de ocorrerem estranhas conjunções astrais de caráter planetário e alinhamento da Terra com o Sol e o centro de nossa Via Láctea, sem descartar que receberemos uma potente radiação luminosa com origem no centro da galáxia.

É certo, caros irmãos: desde agora já existe um extraordinário alinhamento ou conjunção, porém, na verdade, nada tem a ver com fenômenos espaciais mas com um contexto bastante tosco: a concordância raramente vista entre loucos, míticos charlatães e um ou outro “espertalhão” que, como ocorre desde tempos remotos, se beneficiam da credulidade de uns tantos incautos. E não tem faltado aqueles que, ao estilo dos Testemunhas de Jeová, preparam abrigos para esse dia: no México, um grupo de estrangeiros italianos, pertencentes a uma seita dita “apocalíptica”, ergue, em uma remota e humilde comunidade de Yucatán chamada Xul, na delegação de Oxkutzcab, uma “cidade do fim do mundo” chamada Bugarach. Talvez este grupo tenha acreditado no pitoresco ditado [mexicano]: “Se o mundo terminar, vou-me embora para Yucatán”e aí querem fazer sua “torre de babel”. Segundo alguns operários, nessa cidade são fabricados seus próprios alimentos orgânicos.

Por isso, ao procurar o início dessas profecias fatalistas, descobre-se que realmente a cultura maia sabia que os humanos sofreriam uma crise sem precedentes, razão pela qual deixaram registros dos fatos que nãoexperimentaríamos. Mas será possível que esta Cultura, que desconhecia a existência de outras terras continentais, possuía uma visão global de destruição?

A perspectiva profética dos maias está sujeita às mais diversas. Creio que sejam más interpretações, mas muitos asseguram que esses antecedentes registrais podem ser encontrados nos vestígios de pedras dispersas pelo enorme território que essa civilização pré-hispânica ocupou e que hoje faz parte do México, Honduras, Belize, Guatemala e El Salvador.

Muitos asseguram que nos livros do “Chilam Balam”, provenientes da tradução castelhana de hieroglifos maias arcaicos, encontra-se o registro do que haverá de ocorrer no tempo vindouro.

O FIM DO MUNDO?

Conforme o dr. Mark Van Stone, estudioso da cultura maia, a breve resposta para essa especulação é: Não será o fim do mundo! Van Stone afirma que há diversas razões pelas quais as “profecias maias” devam ser lidas de maneira bastante crítica:

a) Elas são fragmentárias – Isto porque temos apenas um pouco das passagens históricas (que certamente é bem maior) e que até hoje estão perdidas.

b) São contraditórias – As fontes astecas, mistecas e maias não estão de acordo entre si: todas as datas associadas à “data final” são diferentes.

c) Foram manipuladas – Tlacaélel, ministro de três imperadores astecas, fez com que a história fosse totalmente reescrita para exaltar os “mexicas” e denigrir os rivais.

d) Não há qualquer menção a destruição – e nem de renovação humana, possível melhora ou despertar de consciência interligada com a data final de dezembro de 2012.

A respeito da História Moderna, existem mais de 50 supostos profetas que têm se arriscado a pressagiar o ano, mas nunca ninguém “o captou” (e me atrevo a dizer que jamais captarão). Com efeito, o fim do tempo é um mistério para a humanidade… A maioria das profecias são de fundo religioso ou relacionadas com seitas (saudação especial aos Testemunhas de Jeová!), muito embora no âmbito da ciência também se tenham feito prognósticos do Fim.

As únicas profecias que sempre se cumpriram tal como estão escritas são as bíblicas. E diga-se de passagem que o próprio Jesus Cristo disse que NÃO há data exata para a consumação de todas as coisas (v. Marcos 13,32-33).

Mas, apesar disso, a Cristandade viu desfilar em sua História “profecias” sobre esse assunto:

– No ano 989, o avistamento de um cometa e a fé popular na iminente segunda vinda de Jesus após cumpridos mil anos de Seu nascimento incitaram, em uma boa parte dos piedosos da Europa medieval, o medo pela vinda do fim do mundo. Raoul Glaber, monge borgonês nascido em 985, faz uma alusão nesse sentido em sua obra “Crônica (Historiae) dos ‘Portentos e Distúbios'” que ocorreram nessas terras entre os anos 900 e 1044. E o mundo não acabou!

– Após o imenso fracasso da profecia do ano 1000, astutamente tentaram transportar a data fatal para o ano 1033, ou seja, para o milésimo aniversário da Paixão, Morte e Ressurreição do Senhor Jesus.

– Após estudar a Bíblia, o pregador norte-americano William Miller (1782-1849), fundador da Igreja Adventista, predisse o fim do mundo para o ano 1843, baseando-se em uma interpretação de Daniel 8,14. Com isto, nasceu o chamado “Movimento Milenarista”, o qual, conforme ia se aproximando a data [fatal], foi conquistando força. Após insistência de seus seguidores, o fundador Miller marcou a data do Apocalipse diversas vezes: a primeira foi para 21 de março de 1843; depois, 18 de abril; e, por fim, 22 de outubro do mesmo ano. Como nada aconteceu nesses dias, não houve outra saída para o propagandista do que admitir o seu erro, apesar da desilusão de seus partidários. Não obstante, sua confissão foi marcada pela frase: “Porém, eu ainda creio que o Dia do Senhor está próximo, quase à porta”.  Daí existir sempre uma seita assegurando que o Advento do Messias está muito próximo.

– E o que dizer das profecias falidas dos irmãos Testemunhas de Jeová??? Disso tratarei em um outro artigo…

Apesar disso, na década de 1990 houve um apogeu de correntes fatalistas criadas em torno de seitas cristãs lideradas por autênticos fanáticos, com objetivos bastante questionáveis: normalmente visando lucro ou suicidas por sua desordenada vida espiritual. Por exemplo:

– O “pastor” coreano Lee Jang Rim, da denominada Igreja Tami, convenceu milhares de pessoas de várias partes dos Estados Unidos e Coreia do Sul de que a Parusia do Senhor Jesus se daria em 28 de outubro de 1992; e, por isso, o mundo chegaria ao fim. Transcorreram dois meses e o pastor Jang Rim foi preso pelas autoridades civis por defraudar de seus adeptos pouco mais de 4 milhões de dólares. Uma quantia considerável! Planejava pagar todas as suas dívidas e comprar uma luxuosa mansão paradisíaca, ou seja, montar seu paraíso na Terra.

– Logo após, em 1992, o radialista de uma estação “cristã”, chamado Harold Camping, informou que o dia do aguardado Juízo Final ocorreria em 6 de setembro de 1994, segundo seus cálculos matemáticos. Em razão disso, gananciosamente publicou um livro em que fundamentava a sua “profecia”. Tempos depois, percebendo que a sua função de “Pitágoras Bíblico” não havia dado certo, pois sua predição não havia se cumprido, Camping teve que admitir publicamente o seu erro.

Também durante a década de 1990 e início dos 2000, ocorreram muitos atentados, fatos violentos e um grande número de suicídios em massa motivados pela crença da “iminente chegada do fim do mundo”.

Entre estes casos estão: o assalto ao grande rancho de Wacco (Texas), em 1993, onde morava o denominado “Ramo dos Davidianos”, seita comandada pelo líder fanático David Koresh; o ataque ao metrô de Tóquio, realizado pelo culto Aum Shinrikyo, em 1995, onde 5 mil pessoas foram intoxicadas e quase perderam a vida; e o suicídio coletivo de cerca de 40 membros da seita “Heaven’s Gate”, que em 1997 acreditavam que uma nave extraterrestre oculta na cauda de um cometa viria salvá-los. E assim o mundo acabou para eles!

Quem também não se recorda do chamado “Bug do Milênio” no final da década de 1990? Havia a crença de que, pela falta de previsão da mudança do milênio [nos sistemas de informática], haveria um caos global que favoreceria a extinção da civilização. Os crédulos desta teoria diziam que às zero hora de 1 de janeiro de 2000 o sistema financeiro mundial sofreria um colapso, as empresas de todos os portes quebrariam, os governos mundiais desapareceriam e, ato contínuo, surgiria a anarquia. Não faltaram aqueles que falavam de dias de obscuridade e era triste observar como alguns ingênuos carregavam velas, provisões alimentícias e até cortinas para serem “benzidas” nas igrejas. Tudo isso um autêntico sonho!

Em 2010, o famoso Robert Fitzpatrick, um aposentado nova-iorquino gastou sua fortuna promovendo uma publicidade fatalista no metrô de Nova Iorque e em alguns lugares da América Latina. Isto porque sua crença se baseava na “nova profecia” propagada pelo radialista Harold Camping, de quem já falamos; porém, seus novos cálculos lhe diziam que o “acabou-se” começaria em 21 de maio de 2010 e se concluiria em 21 de outubro desse mesmo ano. E eis que aqui estamos… e o mesmo se dará com [as profecias] maias!

E como se tudo isso já não bastasse, para aqueles que pensam que [o fim] se dará em 2012, lamentamos informar que o nosso sistema de contagem de anos possui um erro, de forma que estamos a 2018 anos do nascimento do Senhor Jesus. Por isso, fazer corresponder o nosso sistema de contagem com o sistema maia traz sérios problemas e o sentido último dessas profecias não seria compreensível sem se referir à longa contagem (a medição do tempo dos maias), cuja unidade é o kin (=1 dia).

Como usavam o código vigesimal (20 unidades), era muito importante para eles o “vinal (ou “uinal“), de 20 dias. “1 tun é “1 ano maia” de 360 dias. “1 katún são 20 anos (=7200 dias) e “1 baktún” (=20 katuns) são 144.400 dias. Assim, de 3113 a.C. a 2012 d.C. teriam transcorrido 13 baktunes.

Quanto a isso, estudiosos mexicanos asseveraram que “em nenhum lugar [os maias] escreveram que em 2012 ocorreria o fim do mundo, até porque operaram, inclusive, com datas posteriores a esse ano”, como afirmou o reconhecido epigrafista Carlos Pallán Gayol, do Instituto Nacional de Antropologia e História (INAH), para um conhecido jornal diário do México.

Para esse cientista, é importante contextualizar as evidências arqueológicas. Dessa forma, na inscrição de Tortuguero é apontada uma data coetânea para aqueles que ergueram o monumento no século VII d.C. e, de repente, no texto hieróglifo, emprega-se o que se chama de “número de distância”, que aponta para 13 séculos adiante: o dia 21 de dezembro de 2012.

“‘Pois bem: o que nos expressa o Monumento 6? O que ocorrerá nessa data? Indica expressamente que vai terminar um período. Os maias sempre louvam os finais de período assim como hoje festejamos os aniversários: os lustros (=5 anos), as décadas (10 anos), o centenário (100) ou o bicentenário (200) de um fato histórico. Porém, isso não significa que o mundo irá acabar’, formulou Pallán”.

Para o pesquisador da Coordenação Nacional de Arqueologia [do México], diferentemente das sociedades modernas, para os maias o tempo não era algo indeterminado: era formado por ciclos e estes, às vezes, eram tão precisos que recebiam nome e podiam ser personificados mediante imagens de seres animados; por exemplo, o ciclo de 400 anos era representado por uma ave mitológica.

Isto porque os maias se preocupavam mais com os ciclos do que com o tempo; sua importância era realizar rituais que de algum modo garantiriam a prosperidade do ciclo vindouro. Para o caso específico da menção a 2012 (conforme o nosso calendário), nota-se certa insistência que, mesmo em data tão distante, se recorde de um ciclo calendárico estabelecido.

Segundo esse pesquisador, algumas vezes se tem comentado coisas tão absurdas, tais como: que os antigos maias não conheciam além do ciclo corrente ou que uma vez atingido [o ciclo], este período de tempo se acabaria. Os maias usavam ciclos enormes, inclusive de bilhões de anos, através do sistema de longa contagem, que também era comum para outras culturas da Mesoamérica, como é o caso da “istmenha” ou “mixe-zoque”. Os maias jamais mencionam que o mundo irá acabar, nem mesmo o tempo.

A passagem específica do Monumento 6 de Tortuguero é bastante breve e simplesmente diz que uma vez cumprido o 13 BÆakÆtun – algo análogo ao 23 de dezembro de 2012 -, descerá do céu Bolon YokteÆ KÆu, isto é, o deus ou deuses dos Nove Pilares. Isso, em sentido mitológico, não significa nada. Portanto, não se deve interpretar como um evento fatalista, já que os maias empregaram datas posteriores a 2012. Sabe-se que o Templo das Inscrições de Palenque menciona data que ocorre mais de 2 mil anos depois, ou seja, em 4772. E havendo civilizações até lá, estas também as preocuparão!

Muitos ficarão decepcionados ao saber do teor deste Monumento 6, que não é nada catastrófico. Pelo contrário, os maias faziam calendários bem extensos para legitimar seu poder sobre os povos conquistados, aos quais apontavam que seu poderio se estenderia por milhares de anos, assim como com diversos deuses míticos. Portanto, aqueles que creram nisso, simplesmente o fizeram porque foram presas da criatividade e inteligência maia. No que diz respeito a mim, creio em Alguém superior aos maias e em um Povo que não espera que baixe; mas, ao contrário, que vive com seu Deus… com o Emanuel (Deus conosco).

Em 21 de dezembro de 2011, 1 ano antes do vaticínio pseudomaia, a NASA garantiu que não tem observado a presença de corpos celestes próximos da Terra e descartou mudanças magnéticas. Portanto, os cientistas da NASA refutam incisivamente que o mundo acabe em 2012, bem ao contrário do que informam algumas páginas de mal agouro na Internet, que aproveitam o fim do calendário maia para prever catástrofes. A NASA, agência espacial dos Estados Unidos, assegurou que essa data é o fim do extenso período de contagem maia; porém, da mesma forma como o nosso calendário começa novamente em 1º de janeiro de 2012, começará também um outro período no calendário maia.

Não devemos nos esquecer que a Terra está sempre cercada de corpos celestes, como cometas e asteroides. O último impacto de um asteroide de tamanho significante foi aquele que causou a extinção dos dinossauros há 65 milhões de anos; porém, em nossos dias, existe um setor da NASA, assim como outros observadores no mundo, que acompanham e detectam se a Terra está na trajetória de algum deles. Portanto, Niribu e outros planetas fora de órbita são um equívoco: se algum corpo celeste ameaçasse a Terra, nossos astrônomos o estariam acompanhando há pelo menos 10 anos; inclusive, seria visto a olho-nu aqui da Terra. E isto não tem ocorrido.

Ademais, devemos considerar que sempre estamos expostos a que HOJE seja o nosso último dia de existência ou, em todo caso, que o Senhor Jesus regresse a qualquer instante para julgar os vivos e os mortos, separando o Bom Pastor aqueles que O amaram e o obedeceram com sinceridade. Em ambos os casos, NÃO há uma data pré-estabelecida!

“Cristo não é Religião!” – De onde vem este grito de guerra?

Autor: José Miguel Arráiz
Fonte: http://www.apologeticacatolica.org
Tradução: Carlos Martins Nabeto

INTRODUÇÃO

“Cristo não é religião!” – Esta é a frase lançada muitas vezes na cara dos católicos que se orgulham de pertencer à Igreja. Esta frase geralmente é dita incluindo uma atitude inconsciente de ter atingido um nível espiritual mais elevado, e que o pobre católico ainda não se deu conta desta “grande verdade”. Mas isto é verdade? Para aprofundar, fiz este breve estudo.

PEQUENOS EXEMPLOS DESSA IDEOLOGIA

Uma ideologia que vem progressivamente conquistando muitas igrejas cristãs não-católicas é uma recente negação da religião. É surpreendente ouvi-los dizer: “Cristo não é religião”, “Eu não pertenço a religião nenhuma; possuo uma relação pessoal e verdadeira com Jesus Cristo” e outras frases semelhantes.

Recentemente, conversava sobre isso por chat com uma amiga evangélica desta mesma comunidade e ativei o registro automático da conversa. A seguir, um pequeno extrato da mesma:

Kattvic: Você é cristão?

José: Sim, sou cristão católico.

Kattvic: Ah, tá.

José: E você?

Kattvic: Bem, eu era católica, mas agora sou convertida a Cristo.

José: Mas quando você era católica não era convertida a Cristo?

Kattvic: Sim, mas não era a mesma coisa. Quando alguém é católico esquece muitas coisas.

José: Quando alguém é católico e não aprofunda sua fé, pode ser que esqueça muitas coisas. Mas quando se aprofunda e possui verdadeira relação com Cristo, isto não ocorre.

Kattvic: Bem, isso é verdade, mas também é verdade que, como católicos, não nos aprofundamos na relação com Cristo. É certo que isso não vale para todos, mas para a maioria.

José: Em todas as igrejas existem crentes “nominais”, se é que podem ser chamados de “crentes”.

Kattvic: Bem, eu não estou falando de religião, porque se assim fosse, eu não teria nenhuma. Meu amor para com o Todo-Poderoso supera a barreira das religiões.

José: O que é religião para você?

Kattvic: Bem, religião é quando você diz que possui uma e vai até a sua igreja rezar, cantar e tudo o mais; e quando você sai desse lugar, continua sendo o mesmo.

José: Mas quem te disse que isso é religião? Já procurou o significado de religião no dicionário?

Kattvic: Não, não procurei. Mas o digo por experiência pessoal.

José: Isso não é coisa de experiência, é coisa de saber o que significa a palavra. Eu te pergunto: a Bíblia diz que a religião é coisa boa ou má? O que ela fala acerca da religião?

Kattvic: Bem, eu não conheço muito a Bíblia pois ainda estou começando a lê-la… Eu não sei qual é a definição dos outros; a minha é pessoal. Assim eu sinto, assim eu creio.

O que me chamou a atenção nesta conversa é que a moça possuía uma definição totalmente sentimental da palavra “religião” e quando lhe pedi para que me argumentasse racionalmente (pelo dicionário) ou biblicamente (por alguma passagem bíblica), não soube me dizer o porquê da sua fé não poder ser conceituada como religião; simplesmente concluiu com um profundo e contundente:

“Assim eu sinto, assim eu creio”… E PONTO!!!

Certamente, ela era uma cristã com pouco conhecimento bíblico, mas o curioso é que esta maneira de pensar pode ser vista em líderes e pastores evangélicos, o que me surpreende por demais. Quando eu lhes peço para que me fundamentem biblicamente tal afirmação, não encontro ninguém que me possa dar uma resposta satisfatória.

Porém, esta nova ideologia possui fundamento? O que diz o senso comum? O que diz a Bíblia?

CONCEITO DE RELIGIÃO

Para encontrarmos o real significado da palavra “religião” devemos procurar na fonte mais autorizada do mundo, no que se refere ao significado das palavras em espanhol[*]: o dicionário da Real Academia Espanhola; e, depois, em outra fonte para ser facilmente verificada por vocês, leitores.

O dicionário da Real Academia Espanhola nos dá como significado principal e secundário da palavra “religião” os seguintes:

Dicionário da Real Academia Espanhola: Religião [Do lat. religĭo, -ōnis] 1. Conjunto de crenças ou dogmas acerca da divindade, dos sentimentos de veneração e temor para com ela, das normas morais para a conduta individual e social, e das práticas rituais, principalmente a oração e o sacrifício para prestar-lhe culto. 2. Virtude que move a prestar a Deus o culto devido.

A enciclopédia Microsoft Encarta diz:

Enciclopedia Microsoft Encarta, Religião: Em termos gerais, forma de vida ou crença baseada em uma relação essencial de uma pessoa com o universo, ou com um ou vários deuses. Neste sentido, sistemas tão diferentes como Budismo, Cristianismo, Hinduísmo, Judaísmo e Xintoísmo podem ser considerados religiões. No entanto, em um sentido aceito de uma forma corrente, o termo religião se refere à fé em uma ordem do mundo criado pela vontade divina, o acordo com o qual constitui o caminho de salvação de uma comunidade e, portanto, de cada um dos indivíduos que desempenhem um papel nessa comunidade. Neste sentido, o termo se aplica sobretudo a sistemas como Judaísmo, Cristianismo e Islamismo, que implicam fé em um credo, obediência a um código moral estabelecido nas Escrituras Sagradas e participação em um culto. Em seu sentido mais estrito, o termo alude ao sistema de vida de uma ordem monástica ou religiosa.

Resumindo: dos significados que a Real Academia Espanhola e a Enciclopédia [Encarta] nos oferece, podemos concluir que “religião” é a forma que cada pessoa possui de se relacionar com Deus, prestando-lhe o culto que Lhe é devido.

Sob este conceito, o Cristianismo é definitivamente uma religião. O mesmo dicionário da Real Academia o define:

Dicionário da Real Academia Espanhola: Cristianismo 1. Religião cristã.

A enciclopédia Encarta nos apresenta uma definição semelhante:

Enciclopédia Microsoft Encarta: Cristianismo: religião monoteísta baseada nos ensinamentos de Jesus Cristo segundo se recolhem nos Evangelhos, que marcou profundamente a cultura ocidental e é atualmente a maior do mundo. Está amplamente presente em todos os continentes do globo e é professada por mais de 1,7 bilhão de pessoas.

O Cristianismo não somente é mundialmente considerado como religião como também é a maior do mundo. Afirmar-se cristão e dizer que seu cristianismo “não é religião” é simplesmente rejeitar o significado da palavra, viver em um universo imaginário onde as palavras significam para si o que quer que signifiquem, embora não o signifiquem para “o resto do mundo”.

Se você é cristão, o Cristianismo é a SUA RELIGIÃO; quanto a isso, não resta dúvida. Não importa que alguém não goste dessa palavra, que tenha desenvolvido antipatia por ela. O significado não será alterado em todos os dicionários do mundo apenas porque tal pessoa “sinta” ou “acredite” que [a sua fé] não é “religião”.

Muitos poderão querer dar à palavra o seu próprio significado, mas sua posição terá fundamento para o senso comum?

A RELIGIÃO SEGUNDO A BÍBLIA

Passemos agora para o segundo ponto; vejamos o que diz a Palavra de Deus sobre “religião”, já que se a posição de [alguns] irmãos [separados] faz sentido, deverá haver alguma passagem bíblica apoiando tal posição. Será que há?

NÃO, não há! Não há em toda a Bíblia nem uma só passagem que fale mal da religião, ainda que seja só um pouquinho. Ao contrário, a palavra “religião”, “religioso”, “religiosa” aparece 7 vezes e em nenhuma delas se pode verificar um significado negativo; muito pelo contrário.

João 9,31 – “Sabemos que Deus não ouve os pecadores; mas, se alguém é religioso e cumpre a Sua vontade, será ouvido”.

A passagem acima narra a forma como o cego refuta os fariseus que não explicavam como ele pôde ter sido curado por Jesus. Quando os fariseus O insultam, ele lhes responde com estas sábias palavras, para dar-lhes a entender que se Cristo o curou é porque Deus O escutava; muito interessante, aliás, as palavras que emprega: “se alguém é religioso e cumpre a Sua vontade, será ouvido”.

O próprio Paulo, quando foi perseguido pelos judeus, foi perseguido em razão da “sua religião”, como nos ensina a Bíblia:

Atos 25,19 – “Apenas tinham contra ele algumas discussões acerca de sua própria religião e sobre um tal Jesus, já morto, o qual Paulo afirmava que vivia”.

Muitos podem dizer que possuem religião, porém, Paulo não era cristão? E a Bíblia diz que Paulo possuía religião! Se Paulo tinha religião e era perseguido em razão dela, porque esses não têm religião?
Paulo posteriormente explica que ele havia sido fariseu e alega que o Judaísmo era a “sua religião”:

Atos 26,5 – “Eles me conhecem há muito tempo e se quiserem podem testemunhar que tenho vivido como fariseu conforme a seita mais estrita da nossa religião”.

Importante observar que ele não diz que essa já não é mais a sua religião. Notemos que quando Paulo diz “nossa religião” implica que a considera “sua também”. O Judaísmo era a verdadeira religião, mas agora alcançava sua plenitude com Cristo. Paulo não trocou de Deus, mas O conheceu em plenitude através da revelação de Jesus Cristo.

Uma das passagens mais contundentes que menciona a palavra “religião” é a seguinte:

Tiago 1,26-27 – “Se alguém  se crê religioso mas não coloca freio em sua língua, engana seu próprio coração e sua religião é vã. A religião pura e intocável diante de Deus Pai é esta: visitar os órfãos e as viúvas em sua tribulação e conservar-se incontaminado pelo mundo”.

Esta passagem é muito, mas muito ilustrativa para o assunto que estamos tratando. Esta passagem nos explica “como se deve viver a religião” e começa dizendo que nossa religião é vã se não colocamos freio em nossa língua e continua descrevendo-nos as características da verdadeira religião.

Essa passagem não diz que a religião é coisa má ou que o cristão não tem religião, mas existe “uma religião pura e intocável diante de Deus Pai”; uma religião cuja característica é que se viva a partir do interior, não como um mero cumprimento de preceitos, mas impregnada de uma fé viva que se manifesta em obras, em caridade para com os necessitados e por manter uma vida isenta de pecado.

O problema nunca foi a religião, pois a religião é indispensável. O problema para muitos de nós pode ter sido viver a religião exteriormente e não a partir do interior. Não possuir uma religião baseada sobre uma fé viva, ativa – uma “fé sem obras”, no dizer de São Tiago – é uma fé morta.

Tiago 2,26 – “Porque assim como o corpo sem espírito está morto, assim também a fé sem obras é morta”.

DE ONDE VEM ESTA REJEIÇÃO À RELIGIÃO POR PARTE DOS IRMÃOS?

Muitos irmãos separados, ao tentarem se desligar de normas e dogmas, além de possuir fortes sentimentos anticatólicos, têm tratado de redefinir a palavra  “religião”, associando-a com um simples e mero “cumprimento de preceitos”. Pois bem: após terem feito tal associação e redefinição da palavra, para que não se vejam afetados pela mudança, “desfazem o nó” dizendo que o que praticam não é “religião” (mas o que os outros fazem, sim). É uma forma inovadora de se distinguirem como um “verdadeiro crente livre de dogmas e religiões”, oferecendo-lhes uma sensação de liberdade, permitindo-lhes não estar sujeito a nenhuma espécie de autoridade, exceto naquilo que entendem da Bíblia e sob suas próprias interpretações. Se não gostam do que alguma igreja diz, mudam para outra; e se forem carismáticos, talvez fundem uma nova. Como já existem milhares [de igrejas] e já foras empregados quase todos os nomes conhecidos, talvez acabem chamando de “Pare de Sofrer” ou “Testemunhas de Deus”. E, por fim, o que resta?

Eu a chamaria de “apenas mais uma religião”, mas “sob medida”. Isto não está de acordo com o que exige a Palavra de Deus:

1Coríntios 1,10 – “Vos conjuro, irmãos, pelo nome de nosso Senhor Jesus Cristo: tenham todos um mesmo pensar e não haja divisões entre vós; ao contrário, estejais unidos em uma mesma mentalidade e juízo”

A passagem acima não é uma “sugestão”, mas uma “ordem” em nome de Cristo, que exige dos cristãos UNIDADE; não uma unidade aparente, mas uma unidade que implica coesão de fé, quer em mentalidade, quer em juízo.

QUAL A CONSEQUÊNCIA DESSA IDEOLOGIA?

Sem que percebam, estão apoiando o lema marxista sob o qual milhares de cristãos foram perseguidos e submetidos. Ei-lo:

“A religião é o ópio dos povos” (Karl Marx).

E prepara o cristão pouco instruído a tornar-se vítima do enganoso [movimento de] Nova Era, que prega exatamente o mesmo, mas que todavia segue adiante, afirmando que todas as religiões são iguais (inclusive o Cristianismo). Para eles, Cristo é apenas um ser iluminado, rebaixado ao nível de Maomé, Sai Baba, Dalai Lama e tantos outros.

E QUAL É A VERDADE?

Nós, cristãos, temos uma verdade clara:

João 14,6 – “Disse Jesus: ‘Eu sou o Caminho, a Verdade e a Vida. Ninguém vai ao Pai senão por Mim”.

Cristo é o único caminho para o Pai. Portanto, Cristo não é religião, mas “a verdadeira religião”, “a religião em plenitude”, “a forma perfeita de se relacionar com o Pai”. Não há outro nome pelo qual os homens possam ser salvos. Porém, estar unido a Cristo é estar unido à Igreja, que é o seu Corpo.

CONCLUSÃO

Quando um irmão tornar a vir com a “profunda” frase: “Cristo não é religião”, tente fazê-lo entender que está repetindo um lema novo e sem sentido; um lema que nem sequer os protestantes pregavam no século passado e que tampouco pregam hoje as igrejas protestantes tradicionais. Peça para que ele argumente biblicamente o que afirma, que analise o que está dizendo, que perceba que só está repetindo “o lema do pastor”, mas que é algo que realmente não possui o menor fundamento bíblico. Tente fazê-lo entender o real significado da palavra… Talvez você consiga fazê-lo refletir e, assim, perceber que está repetindo algo “sem fundamento”.

—–

NOTA
[*] Definições semelhantes podem ser facilmente encontradas em dicionários da língua portuguesa; p.ex: “Moderno Dicionário da Língua Portuguesa – Michaelis”, um dos mais extensos em significados: religião – re.li.gião – sf (lat religione) [1] Serviço ou culto a Deus, ou a uma divindade qualquer, expresso por meio de ritos, preces e observância do que se considera mandamento divino. [2] Sentimento consciente de dependência ou submissão que liga a criatura humana ao Criador. [3] Culto externo ou interno prestado à divindade. [4] Crença ou doutrina religiosa; sistema dogmático e moral. [5] Veneração às coisas sagradas; crença, devoção, fé, piedade.[6] Prática dos preceitos divinos ou revelados. [7] Temor de Deus. [8] Tudo que é considerado obrigação moral ou dever sagrado e indeclinável. [9] Ordem ou congregação religiosa. [10] Ordem de cavalaria. [11] Caráter sagrado ou virtude especial que se atribui a alguém ou a alguma coisa e pelo qual se lhe presta reverência. [12] Conjunto de ritos e cerimônias, sacrificais ou não, ordenados para a manifestação do culto à divindade; cerimonial litúrgico. [13] Filos= Reconhecimento prático de nossa dependência de Deus. [14] Filos= Instituição social com crenças e ritos. [15] Filos= Respeito a uma regra. [16] Sociol= Instituição social criada em torno da ideia de um ou vários seres sobrenaturais e de sua relação com os homens. [17] Mística ou ascese. R. do caboclo, Reg (Rio de Janeiro): prática feiticista negra a que se misturam entidades da mística ameríndia. R. do Estado: a professada oficialmente por um Estado sem que, com isso, seja proibida ou impedida a prática das outras. R. natural: a que se baseia somente nas inspirações do coração e da razão, sem dogmas revelados; a religião dos povos primitivos. R. naturalista: veneração ou adoração religiosa da natureza nos animais, nos astros etc.; panteísmo. R. reformada: o mesmo que igreja reformada. R. revelada: a que, como o cristianismo, se baseia numa revelação divina conservada pelas Escrituras Sagradas e pela tradição. Ciência das religiões: estudo das religiões como fenômeno humano universal; pode-se considerar seu aspecto histórico (história das religiões), psíquico (psicologia da religião) e social (sociologia da religião). Filosofia da religião: tratado das questões relativas à sua essência e verdade (
N.doT.).

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