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O Demônio sabia que Jesus era Deus?

– “Sabia o demônio, antes da Paixão e da Morte de Jesus Cristo, que Ele era Deus? Em caso negativo, atualmente sabe que Jesus é Deus?” (Jolide – Petrópolis-RJ).

Antes da Paixão, logo no limiar da vida pública de Jesus, o demônio O quis tentar por três vezes, como referem os Evangelistas (Mateus 4,1-11; Lucas 4,1-13; Marcos 1,13). Tal fato é claro indício de que o Maligno ignorava ser Jesus o próprio Deus. Essa ignorância manteve-se até o fim da vida pública de Cristo, pois São Paulo insinua que, se os demônios tivessem conhecido o plano misterioso de Deus,“nunca teriam crucificado o Senhor da glória” (1Coríntios 2,8).

Satanás, porém, suspeitava que Jesus fosse um varão extraordinário, escolhido por Deus para ser Profeta ou talvez mesmo o Messias aguardado — o Messias que, conforme a opinião mais corrente em Israel, não seria Deus em sentido próprio, mas poderia chamar-se “Filho de Deus” por ser criatura muito unida à Divindade. Foi, portanto, para certificar-se da missão messiânica (não propriamente para certificar-se da Divindade) de Jesus e pô-la à prova que o demônio lhe fez as sugestões tentadoras, usando da fórmula:“Se és o Filho de Deus…” (cf. Mateus 4,36); note-se que a terceira sugestão, a qual prometia a Jesus a posse de todos os reinos deste mundo (cf. Mateus 4,8-9), correspondia claramente ao conceito de Messias mais propalado entre os judeus: o Messias político, que libertaria Israel do jugo dos romanos e instauraria a hegemonia internacional de sua nação.

Conforme Marcos 1,24, o demônio confessava que Jesus era o “Santo de Deus”. Este título, segundo a sua etimologia, significava “o homem posto à parte e consagrado ao serviço de Deus”; embora não fosse designação habitual do Messias, bem podia significar “o Salvador” (cf. a confissão de Pedro em João 6,69:“o Santo de Deus”). O demônio teria então reconhecido em Jesus o Messias como o concebiam os judeus: criatura eminente, não o próprio Deus Encarnado. São Lucas confirma esta conclusão, quando narra: “Os demônios saíam de muitos (possessos), clamando e dizendo: ‘Tu és o Filho de Deus!’; Ele, porém, preceituando-lhes com poder, não os deixava falar, porque sabiam que era o Cristo (=palavra grega correspondente ao hebraico ‘Messias’)'” (Lucas 4,41; cf. Marcos 1,34).

O fato de Jesus não permitir, no início da sua vida pública, que os maus espíritos O proclamassem “Messias” se explica em vista da concepção errônea que os fariseus nutriam a respeito do Messias; esperando um rei que sacudisse o domínio estrangeiro, poderiam ter feito de Jesus um chefe de revolução nacionalista, fechando-se assim por completo ao genuíno sentido do Evangelho. Só aos poucos foi Cristo revelando o significado da sua missão; o pensamento do Senhor ficou bem claro, pois foi precisamente por se ter declarado Messias num sentido transcendente que Ele sofreu a morte (cf. Marcos 14,61-84; Mateus 24,63-65; Lucas 22,67-71).

Quanto aos tempos atuais, ensinam os teólogos que o demônio não sabe que Jesus é Deus no sentido estrito; não conhece o mistério do Verbo Encarnado. Contudo percebe e analisa, ainda com mais acuidade do que os homens, os indícios de que a obra de Cristo e a história da Igreja são algo de Divino. Coagido pela evidencia, ele reconhece algo do plano de Deus no mundo; este reconhecimento, porém, nada tem de sobrenatural; “os demônios creem, e estremecem”, diz São Tiago (2,19).

Satanás tem consciência, entre outras coisas, de que a morte e a glorificação de Cristo lhe vão progressivamente arrebatando as almas; seu domínio vai sendo debelado nas regiões e nos povos em que ele outrora, pela idolatria e os falsos cultos, reinava incontestado. Suspeita que seu poder terá fim; por isto, estremece (como diz o Apóstolo) e se atira sobre as almas com furor cada vez mais requintado, sabendo que é preciso aproveitar toda e qualquer oportunidade (cf. Apocalipse 12,17). Vãs, porém, ficam as suas invectivas contra aqueles que se firmam no Rochedo que é o Cristo (cf. 1Cor 10,4); o demônio é como o cão acorrentado que ladra, mas só pode morder a quem, por iniciativa própria, dele se aproxime (cf. Santo Agostinho)!

  • Fonte: Revista Pergunte e Responderemos nº 4:1957 – ago/1957.

O Primado de Pedro

Ubi Petrus, ibi Ecclesia.
(S. Ambrosio)

Introdução

Uma das grandes razões de divergência entre católicos e protestantes diz respeito à legitimidade para a interpretação das Sagradas Escrituras. Para os seguidores da reforma, qualquer pessoa poderia ler e entender corretamente a bíblia, sem o auxílio de ninguém senão do Espírito Santo, que guiaria cada um infalivelmente na busca do verdadeiro significado da palavra divina. É o chamado livre exame da Bíblia, proposto pelo ex-frade Lutero.

Para os católicos, o legítimo intérprete das Escrituras (e também da Tradição) é o papa, sucessor direto de São Pedro, pois Cristo confiou a ele esse ministério. Ao Papa, portanto, devem os católicos obediência em matéria de fé e moral, em função do poder divino a ele conferido.

Os protestantes, apesar de discutir as passagens discordantes da bíblia de forma crítica, acabam tendo que reconhecer que cada um, em conexão direta com Deus, tem a sua interpretação, a sua “verdade”, originando-se, dessa forma, o fenômeno da multiplicação das seitas que se constata a partir do século XVI, e que não cessou até hoje.

Cada seita seria uma manifestação de Deus; não importa se defende teses contrárias às das demais, desde que mantenha a “fé” em Cristo. Essa “fé” na verdade se traduziria por um “sentir Cristo”; portanto, trata-se de um ato da vontade e não da inteligência.

A doutrina católica, ao contrário, reconhece que a fé é a adesão da inteligência às verdades reveladas por Deus. Sendo verdades, elas não podem variar nem segundo a pessoa que as interpreta, nem segundo a época, pois a verdade é imutável.

Cabe ao papa guiar os fiéis nos ensinamentos de Cristo confiados à Igreja em depósito, o qual não pode ser alterado até a consumação dos séculos.
Importa pois saber qual das duas visões corresponde à vontade divina, pois aí teremos resolvido o problema da interpretação da Bíblia Sagrada, que é motivo de divergência entre católicos e protestantes. Examinemos pois, em primeiro lugar, as Escrituras.

Os protestantes afirmam que, para defender a posição católica, só existiria uma passagem do Evangelho de São Mateus (XVI, 16-19), a qual não possui paralelo com os dois outros Evangelhos que descrevem a mesma cena, de interpretação duvidosa.

Pedro seria como os demais apóstolos, diferindo apenas no caráter agressivo, o que faria com que liderasse os demais, seguindo e obedecendo a Cristo. Entretanto, Nosso Senhor não teria conferido qualquer primado a Pedro entre os Apóstolos.

O que o Evangelho mostra, entretanto, é que Pedro ocupava um lugar de destaque no colégio Apostólico, e que Cristo fez a ele a promessa da primazia entre os apóstolos, para que, uma vez confirmado, confirmasse os seus irmãos (Lc XXII,32). Utilizaremos na maior parte da demonstração dessa verdade o esquema do livro Igreja, Reforma e Civilização, do Pe. Leonel Franca, Ed. Agir, 6a edição.

Pedro é o mais citado pelos Evangelistas

Podemos constatar a proeminência de São Pedro entre os Apóstolos, em primeiro lugar, pela quantidade de vezes que ele é nomeado nos Evangelhos: vários já fizeram notar que os evangelistas fazem referência a Pedro 171 vezes (114 nos evangelhos e 57 nos Atos dos Apóstolos), enquanto que do apóstolo amado, São João, fazem 46 citações.

É o que se poderia chamar de prova estatística, pois mostra como os Evangelistas consideravam a figura do príncipe dos apóstolos, destacada desde cedo pela autoridade de Cristo.
Veremos mais adiante que São Pedro não é apenas nomeado maior número de vezes, mas principalmente em citações que denotam importância, e que o critério numérico simplesmente serve para reforçar este.

Para impugnar esse argumento, alguns fazem notar que São Paulo é nomeado 160 vezes nos Atos dos Apóstolos, onde Pedro aparece 57 vezes, e que portanto, por esse critério, São Paulo teria mais direito ao título de papa.

Entretanto, o que importa demonstrar, com isso, é que houve um que foi destacado entre os doze apóstolos, designado por Cristo para guiar os demais.
Essa questão diz respeito aos primeiros seguidores de Cristo, e quando o Apóstolo das Gentes se converteu, ela já estava decidida. Só Nosso Senhor poderia nomear um seu representante com tal poder e autoridade.

Cristo muda o nome de Simão para Pedro

Outro destaque exclusivo de Pedro é que Cristo, ao chamá-lo a uma nova e superior vocação, lhe atribui curiosamente um novo nome, que carrega o significado poderoso de, ao mesmo tempo, chefe e fundamento da nova sociedade que terá por missão espalhar os ensinamentos do Mestre pelos quatro cantos do mundo. “Este (André) encontrou primeiro seu irmão Simão, e disse-lhe: Encontramos o Messias. E levou-o a Jesus. E Jesus, fixando nele o olhar, disse: Tu és Simão, filho de João, tu serás chamado Cefas, que quer dizer Pedro (Pedra)” (S. João, I, 41-42).

Analisemos em primeiro lugar a mudança do nome: quantas vezes, em toda a Escritura, Deus muda o nome de alguém? Se são poucas as vezes, conclui-se que esse ato é solene, dada a sua excepcionalidade, que faz concluir a gravidade daquilo que o motivou.

Ora, em toda a Sagrada Escritura Deus muda apenas três vezes o nome de homens, sempre para destacar a dignidade de uma vocação superior: primeiro, muda o nome de Abrão para Abraão, tornando-o o patriarca fiel a Deus e recompensado com a Antiga Aliança e a promessa de uma descendência pujante (Gênesis, XVII, 5-8). O segundo eleito é Jacó, a quem Deus nomeia Israel, renovando as promessas feitas ao avô em relação ao povo judeu. A mais nenhum Deus concede esse privilégio, nem a Reis nem a Profetas, que foram tantos e com tal Santidade! No Antigo Testamento, Deus sela a Aliança com seu povo escolhendo e mudando o nome dos Patriarcas, mostrando de forma inequívoca que unge – separa – seus eleitos.

Nosso Senhor então, na plenitude dos tempos, quando a humanidade se encontra preparada para a grande obra da Redenção, vai novamente distinguir aqueles com quem firmará a Nova e Eterna Aliança, mudando o nome do seu Patriarca, que deverá apascentar seus cordeiros e ovelhas pelos séculos, prometendo-lhe Sua assistência infalível. E muda seu nome não para um qualquer, mas para Pedro (Cefas, que em aramaico – língua falada por Nosso Senhor – quer dizer Rocha), mostrando que sua Igreja não seria fundada sobre areia.

Esse é um fato muitas vezes esquecido, ou relegado a um plano inferior, porém tem uma importância enorme, pois demonstra que Pedro deveria ter entre os Apóstolos uma distinção de honra, incompatível com uma idéia de igualdade entre os doze. Notemos que nem São Paulo mereceu tal honra.

Cristo prefere a barca de São Pedro

Outro aspecto interessante da distinção de Pedro diz respeito a sua barca, que desde muito cedo foi interpretada pelos Santos Padres como símbolo da Igreja, unicamente na qual podem se salvar os homens.

Cristo, na sua pregação evangélica, prefere invariavelmente a barca de Pedro. Na verdade, não se nomeia expressamente outra barca de que Cristo tenha se servido.
É na barca de Pedro que ocorre a pesca milagrosa, de uma simbologia extremamente significativa (S. Lucas, V, 3-6). Outra pesca milagrosa irá ocorrer após a ressureição, no lago de Tiberíades, de novo na barca de Pedro (João, XXI, 3,7, 11). A barca de Pedro é chamada de “a barca”, por antonomásia, em outras passagens (Mateus, VIII, 23; XIV, 22; Marcos, IV, 36; VI, 45), em oposição às “outras barcas” (Marcos, IV, 36)

Tiremos a conclusão obrigatória: fora da Barca de Pedro não se acha Cristo.

A casa de Pedro em Cafarnaum e o tributo

Dois fatos aparentemente corriqueiros da vida de Cristo se juntam às evidências até aqui acumuladas, e dizem respeito à proximidade do mestre a Pedro. Primeiro, observa-se pelos Evangelhos que, quando Cristo se demora em Cafarnaum, é na casa de Pedro que se hospeda. “Ao sair da Sinagoga, Jesus e os que o seguiam se dirigiram à casa de Pedro e André …” (Marcos, I,29; Mateus, VIII, 14; Lucas, IV, 38), e que mais tarde, à porta da casa (de Pedro) Jesus fazia milagres. São Marcos, em outras ocasiões, sem mencionar outra casa, diz simplesmente que o Mestre se dirigiu “à casa” e “para casa” (Marcos, II,1; III,20; IX, 32).

É curiosa a diferença nas narrações de São Marcos e São Mateus desse mesmo episódio: este usando artigo – na casa; aquele sem o usar – em casa.
O sentido da primeira expressão é o mesmo que tem, para os franceses, o chez moi, ou seja, em minha casa. Seria um fato estranho São Marcos falar de sua casa, se não soubéssemos ter sido o evangelista discípulo de Pedro. Ao repetir o que ouviu do Apóstolo, ele utiliza a expressão de quem falava da própria casa. São Mateus fala da casa não com sentido próprio, pois falava da casa de outrem. Curioso ainda é que quando os evangelistas falam da casa de Cristo, se referindo à de Nazaré, usam ambos o artigo, evidenciando o detalhe sutil e extremamente probatório da passagem.
Portanto, o Evangelho de S. Marcos demonstra que, em Cafarnaum, Cristo se hospedava na casa de Pedro.

O segundo fato, que está estreitamente ligado ao primeiro, é que Cristo manda pagar o tributo do templo por si e por Pedro, quando os coletores de impostos vão à casa deste cobrar pelo Mestre ” … vosso mestre não paga a didracma? Ele (Pedro) respondeu-lhes: sim. E depois que entrou em casa , Jesus o preveniu, dizendo: Que te parece Simão? De quem recebem os reis da terra o tributo ou o censo? De seus filhos ou de estranhos? E Ele (Pedro) respondeu: dos estranhos. Disse-lhe Jesus: logo são isentos os filhos. Todavia, para que os não escandalizemos, vai ao mar e lança o anzol, e o primeiro peixe que subir toma-o, e, abrindo-lhe a boca, acharás dentro um estater: tira-o e dá-lho por mim e por ti.”(Mateus, XVII, 24-27).
Esse é um sinal tão distintivo da preferência de Nosso Senhor pelo apóstolo, que os demais, logo que Pedro se afasta, cercam o mestre para saber quem seria o maior no reino dos céus (Mateus, XVIII, 1).

Sobre esse texto, Clemente de Alexandria exclamava: “Bem aventurado Pedro, o escolhido, o preferido, o primeiro dos discípulos, único pelo qual Cristo pagou tributo.” (Qui dives Salvetur, 21, Migne, Patrologia serie Grega, IX, 625. – citado pelo Padre Leonel Franca).

A lista dos Apóstolos

Todas as vezes que os evangelistas nomeavam os doze apóstolos, o faziam invariavelmente começando por Pedro e terminando por Judas, com os demais ocupando lugares diferentes (S. Mateus, X, 2-4, S. Marcos, III, 16-19, S. Lucas, VI, 14-16, Atos, I, 13).

Se não é difícil imaginar o porquê do último lugar ao traidor, também não o é o primeiro para Pedro. São Mateus é explícito: “Primeiro, Simão que se chama Pedro.” (S. Mateus, X, 2-4).
Primeiro em quê? Em idade, em chamado para a vocação? Nem um, nem outro.

Se fosse correta a primeira hipótese, a ordem dos demais seria sempre a mesma, e se o fosse a segunda, André e outro discípulo seriam os primeiros nas listas (S. João, I, 35-42).
Em ocasiões excepcionais da vida de Cristo, três apóstolos sempre O acompanhavam: Pedro e outros dois. Na ressureição da filha de Jairo, na manifestação de sua onipotência, na agonia do jardim das oliveiras, no mistério de suas dores, eles estiveram presentes (Marcos, V, 37; IX, 1; XIV, 33 e outros paralelos).

Às vezes, todo o Colégio Apostólico segue a Pedro numa expressão coletiva: “Pedro e os que o acompanhavam” (Marcos, I, 36).
Lemos também no evangelho de S. João que é Pedro quem responde por todos na questão da explicação de Cristo sobre a necessidade de se comer sua carne e beber o seu sangue (portanto, da presença real de Cristo na hóstia), ocasião em que alguns discípulos abandonaram o Mestre.
Depois que Pedro se pronuncia, ninguém mais abandona Cristo.

A grande promessa

Um dos motivos da grande resistência à primazia de Pedro é o fato dele não ter exercido nenhum poder entre os Apóstolos mesmo após as palavras de Cristo que lhe teriam dado esse poder.
O que não entendem os inimigos do papado é que Cristo fez uma promessa a Pedro, e não uma nomeaçao imediata. Não faria sentido Cristo designar Pedro para que guiasse as almas enquanto Ele estivesse no mundo.

Se os Apóstolos e Discípulos se questionavam quem seria o primeiro, ou o maior no reino, era porque pouco entendiam do que Nosso Senhor ensinava por serem almas toscas, e não porque haveria dúvida acerca da primazia. Essa questão já estava definida.

Para que se compreenda, vejamos o seguinte fato: que verdade estaria mais clara para os discípulos de Cristo, do que o caráter transcendental do seu reino? Nosso Senhor continuamente lhes dizia que seu reino não era deste mundo; no entanto, pouco antes da Ascensão aos Céus, um discípulo pergunta se Cristo iria restituir o reino de Israel naquele momento (Atos, I, 7)!

A mãe de Tiago e João pede um lugar de destaque no reino para os filhos (S. Mateus, XX, 24); quando os discípulos disputavam para ver quem era o maior, Cristo os repreendeu dizendo que “Entre os gentios, os reis exercem dominação sobre os súditos. Entre vós, não há de ser assim; antes, o que é maior entre vós faça-se como o menor, e o que manda como o que serve.” (S. Lucas, XXII, 25-27).
Com isso Cristo ensina uma nova forma de exercer a autoridade, mais perfeita, e não pretende combater a primazia daquele que manda, pois aplica a regra de humildade a si mesmo; em outra passagem (S. João, XIII, 13), o mesmo Cristo se diz Mestre e Senhor; aquele pois, que é mestre, sirva para dar o exemplo e praticar a humildade, e não para deixar de ser mestre.

O “Tu es Petrus”

Se todos esses episódios nos servem para reconstituir o quadro da predileção por Pedro, a passagem da grande promessa é o momento solene da confirmação dessa vocação singular. Cristo dirige-se a Pedro, após sua maravilhosa profissão de fé (“Que dizem os homens de mim (…) que dizeis vós?” “Tu és o Cristo, Filho de Deus vivo”!), e confirma sua promessa: “Bem aventurado és Simão Barjona, porque não foi a carne e o sangue que a ti revelou, mas sim meu Pai que está nos céus, e eu digo que tu és Pedro, e sobre esta pedra edificarei minha igreja e as portas do inferno não prevalecerão sobre ela. E eu te darei as chaves do reino dos céus, e tudo o que ligares na terra será ligado também nos céus”(S.Mateus, XVI, 16-19)
Nunca houve texto mais deturpado, mais recortado e refeito, na busca desesperada de alterar-lhe o sentido, que se apresenta simples. Para os protestantes, Cristo estaria falando de duas pedras. A primeira pedra (“tu és pedra”) não é pedra; no máximo, é uma pedra menor, diferente da segunda (“sobre esta pedra”). A primeira é Pedro, a segunda, Cristo, ou a confissão de Pedro, conforme o examinador.

Porém, o texto se dirige todo a Pedro – “tu és Pedro…”; “eu te darei as chaves…”; “tudo que (tu) ligares…” – em resposta à sua confissão, como um prêmio pela sua defesa pública da fé. O texto não traz qualquer interrupção lógica, para passar a se referir a Nosso Senhor. Se assim fosse, a frase ficaria sem sentido: “tu és Pedro, mas não edificarei a minha Igreja sobre ti, senão sobre mim; as chaves do céu porém te darei.”

Ora, é impossivel admitir que a Sabedoria Divina tenha se expressado de forma tão confusa, ainda mais se nos lembrarmos da mudança do nome de Pedro. Lembremos ainda que Cristo falava em aramaico, língua em que Pedro e pedra significam, ambos, Cefas. Não resta qualquer espaço para dúvidas.

Mas, dirão ainda os protestantes: em várias passagens se diz que Cristo é a pedra, o fundamento! Não há dúvida. Mas só Cristo é pedra? Vejamos o que Nosso Senhor diz:”eu sou a luz do mundo” (S. João, VIII, 12) e depois: “Vós sois a luz do mundo”, dirigindo-se aos apóstolos (Mateus, V, 15).

Duas luzes? Sim. Há, portanto, luz e luz, pedra e pedra. Uma luz fonte, outra luz reflexo; uma pedra fundamento invisível, causa e fim dos homens, outra pedra fundamento visível, rocha de sustentaçao da Igreja indefectível e guia infalível dos homens.

Mas não é necessário prolongar a explicação de algo tão evidente, que mesmo alguns protestantes mais honestos já reconheceram. Reproduzimos apenas uma citação feita pelo padre Franca – P. F. Jalaguier, em seu L’Eglise, Paris 1899, p. 219: “Nous nous plaçons encore ici sur le terrain qui leur est le plus favorable (aos católicos) parce qui’ll est à nos yeux le seul vrai; et nous admettons que ce passage renferme une promesse spéciale fait à Saint Pierre” [“Nós nos colocamos ainda aqui num terreno que lhe é mais favorável (aos católicos) porque ele é, a nossos olhos, o único verdadeiro; e nós admitimos que essa passagem contém uma promessa especial feita a Pedro”] .

As chaves do reino dos céus

As doação das chaves indica o poder conferido a alguém de abrir ou cerrar o acesso da casa, da cidade, do reino, sendo costume entre os orientais o suspender as chaves aos ombros em sinal de autoridade.

Não há dúvida de que Cristo confere a Pedro um poder singular, que sempre foi entendido na Igreja como poder infalível (o que ligar na terra, será ligado no céu) e condicionado à vontade divina (o papa não força Deus a ligar ou desligar, mas só pode ligar ou desligar o que Deus quer no céu), e que foi ratificado no Concílio Vaticano I, no século XIX, com a solene proclamação do dogma da Infalibilidade Papal.

Os protestantes freqüentemente atacam esse dogma por desvirtuarem estas duas verdades – o ligar e desligar condicionado, e a ratificação (e não invenção) do dogma;
Na verdade, Cristo não poderia ter agido de outra forma, se quisesse que sua Igreja triunfasse durante os séculos, senão conferindo ao pastor universal, Seu representante na Terra, um poder infalível.

Se esse poder fosse falível, como esperar que não perecesse?

É exatamente o que ocorre com as seitas derivadas do movimento reformador de Lutero, surgindo e desaparecendo aos borbotões.

O “Pasce oves mea”

Como se isso tudo não bastasse, temos ainda o trecho soleníssimo em que Cristo confia o seu rebanho a Pedro, dando-lhe portanto seu poder de jurisdição sobre os cristãos.
A Pedro, e a ninguém mais, é confiado o pastoreio das ovelhas e dos cordeiros, a que nosso Senhor pede três vezes a confirmação de Pedro, e três vezes o confirma: “Disse Jesus a Simão Pedro: Simão, filho de João, tu me amas mais do que estes? Respondeu-lhe Pedro: Sim, Senhor, tu sabes que eu te amo. Disse-lhe (Jesus): Apascenta os meus cordeiros. Disse-lhe outra vez: Simão, filho de João, tu me amas? Ele disse-lhe: Sim, Senhor, tu sabes que eu te amo. Disse-lhe (Jesus): Apascenta os meus cordeiros. Disse-lhe pela terceira vez: Simão, filho de João, amas-me? Ficou triste Pedro, porque pela terceira vez, disse-lhe: Senhor, tu sabes tudo; tu sabes que te amo. Disse-lhe (Jesus): Apascenta as minhas ovelhas.” (S. João, XXI, 15-17)

Ora, Cristo não possuía nem cordeiros nem ovelhas. O que Ele confia a Pedro é seu rebanho de almas, constituindo-o seu pastor.
Aqui novamente temos Pastor e pastor, pois Nosso Senhor é o bom pastor. Alguns tentam reduzir esse episódio a uma mera reconciliação do Apóstolo com Cristo, após a tríplice negação de Pedro na casa de Anás e Caifás, antes da crucificação de Cristo. Porém, esquecem-se que após a Ressurreição, é a Pedro que Cristo aparece primeiro (São Lucas XXIV, 34), mostrando que a traição não fizera Pedro perder sua primazia: Cristo continua considerando Pedro o primeiro.

Cristo, sem dúvida, fez Pedro compreender o horror do pecado e o perigo de não se fugir da ocasião de pecado. O Evangelho nos conta que Pedro chorou amargamente. De fato, que dor não deve ter experimentado o Apóstolo, ao cair num pecado justamente contrário à virtude que mais vemos presente nele: a defesa pública da verdade, o desafiar o respeito humano. Aliás, essa virtude ele que irá praticar em grau heróico a partir de então, dando sua vida pela expansão da Igreja.

Unicamente em relação a Pedro, portanto, vemos a significativa mudança do nome, a sempre testemunhada primazia entre os Apóstolos, o pagamento do tributo, o uso exclusivo de sua casa em Cafarnaum e de sua barca, a promessa solene de ser fundamento da Igreja, a entrega das chaves do reino dos céus, a nomeação para o pastoreio dos fiéis.
E há aqueles ainda que não vêem diferenças entre os doze apóstolos!

Para esses, resta a esperança da promessa de Cristo, de que poderia das pedras fazer filhos de Abraão. Para isso, porém, terão que aceitar que Cristo, de um filho de Abraão, fez Pedra.
São Pedro, após a ascensão de Cristo, assumirá seu dever de pastor universal, conduzindo a Igreja nascente. Após sua morte, será substituído, no decorrer dos séculos, pelos seus legítimos sucessores, os papas, até a consumação dos tempos, sob a assistência infalível de Cristo.
Da qual trataremos num próximo artigo.

Fonte: MONTFORT Associação Cultural

São Pedro, rocha firme de fé inabalável

Fonte: Spiritus Paraclitus

São Pedro, rocha firme de fé inabalável No evangelho, com exceção de alguns episódios, os relatos em que Pedro aparece ocupam um lugar importante, tendo grande semelhança em Mateus, Marcos e Lucas, e mesmo de João. Entre as semelhanças e detalhes característico de cada Evangelista ao relatar os episódios, temos como certo que não se chamava Pedro, mas Simão, em grego, ou Simeão, em aramaico. Ao tomarmos como referência os quatro evangelhos, unânimes nesse ponto, esse nome lhe foi dado por Jesus. Era um novo nome, que até então parecia não ter sido dado a ninguém. Entretanto, os evangelistas situam em diferentes contextos a imposição desse nome por Jesus:

– em Mateus, é no momento da confissão de fé em Cesaréia(Mt 16,18);

– em Marcos e Lucas, tudo indica ser por ocasião da instituição do Doze(Mc 3,16; Lc 6,14). Porém é bom notar, desde o episodio da pesca milagrosa, ele já tratado no Evangelho de Lucas, como Simão Pedro(Lc 5,8);

– em João, é no momento do primeiro encontro às margens do Rio Jordão(Jo1,42).

A diversidade de contextos em que se vê Jesus dar a Simão seu novo nome,”Pedro”, indica que esse fato era bastante conhecido dos primeiros cristãos, mas que por alguns fatores, talvez se tenha esquecido sua circunstâncias exatas, conservando apenas o núcleo central do episódio, que é a clara mudança do nome de Simão para Pedro. O fato é que o cognome dado por Jesus a Simão se propagou na tradição oral impondo-se aos outros nomes. Nas cartas de Paulo, mais antigas que os evangelhos, a transcrição aramaica de “Pedro” – Cefas – tornar-se-ia  a maneira habitual de designar o “primeiro” dos discípulos. Era conhecida a importância de Pedro e sua ligação privilegiada com Jesus nas primeiras comunidades Cristãs, já que sabia que a mudança de nome na Bíblia é sempre sinal de eleição divina.

Pelo fato de Simão ter grande relevância em alguns relatos e seu nome ser descrito por vezes de forma diferente, sendo que se faz referência à mesma pessoa, por parte muitos surgiu uma confusão quanto ao nome, confusão esta que buscarei esclarecer mostrando o significado de cada nome.

Simeão? Simão? Pedro? Cefas?

Simeão era o nome aramaico daquele que Jesus chamará por “Pedro”. Encontramos esse cognome apenas na boca de Tiago, “o irmão do Senhor”, por ocasião da Assembléia de Jerusalém(At 15,14), e na segunda carta cuja autoria é atribuída a “Simão Pedro”, servo e apóstolo de Jesus Cristo”( 2Pd 1,1).

Para uns, Simão seria a versão grega de Simeão; para outros, é um nome genuíno. Pedro é assim nomeado 46 vezes nos evangelhos e somente quatro vezes nos Atos dos Apóstolos(At 10-11).

Cefas é o “novo nome” dado por Jesus a Simão: ele vem do aramaico Kêphâ; é, na origem, um nome comum que significa “pedra”, “rocha”. Ele aparece somente uma vez nos evangelhos(Jo 1,42), ao passo que se encontra 8 vezes nas cartas de Paulo(1 Cor 1,12; 3,22; 9,5; 15; 5; Gl 1,18; 2,9.11.14), sinal de seu uso freqüente desde os primórdios da Igreja.

Pedro(Petros) é a tradução grega de Cefas. É a forma mais corrente nos evangelhos(95 vezes), nos Atos(56 vezes), em Paulo(2 vezes) e nos endereçamentos das epístolas de Pedro(2 vezes).

Simão Pedro: somente João utiliza correntemente esta dupla nomeação(17 vezes). Marcos jamais utiliza; Lucas e Mateus utilizam-se uma vez(Lc 5,8; Mt 16,16).

Em algumas vertentes protestantes, se diz que o nome atribuído a Simão Pedro(“Rocha”) é uma invenção criada por parta da Igreja Católica. Como percebemos, é perfeitamente coerente a exegese Católica quando ensina que Pedro recebe de Cristo um novo nome, em vista de uma missão cuja realização é acompanhada sempre de uma promessa que ultrapassa a pessoa a quem se a dá.  No caso, a missão de Pedro e seus sucessores é firmar os filhos da Igreja na fé, como uma rocha que resiste a séculos de mudanças permanecendo firme sem ser abalada.

Quaresma: tomar em mãos um bom livro, abrir o Evangelho, indica cardeal

É tempo de reflexão, afirma Dom Geraldo Agnelo

SALVADOR, quarta-feira, 4 de março de 2009 (ZENIT.org).- A Quaresma «é tempo de reflexão, porque o cristão é alguém que pensa», afirma o cardeal Geraldo Majella Agnelo.

Ao comentar o sentido da Quaresma em artigo enviado a Zenit hoje, o arcebispo de Salvador (Bahia, nordeste do Brasil) recorda que os primeiros cristãos «acreditaram que também eles tinham necessidade de tomar para si, cada ano, quarenta dias, para meditar sobre o mistério de Jesus morto e ressuscitado».

«Assim nasceu a Quaresma. Quaresma, em latim Quadragésima, significa quadragésimo dia. De quarta feira de cinzas até começar a Semana Santa são quarenta dias.»

«O que fazer nesse tempo? –questiona o arcebispo–. Os evangelistas nos apresentam Jesus como pessoa reflexiva que amava o recolhimento, a meditação, a oração.»

Segundo Dom Geraldo Agnelo, seguindo o exemplo de Jesus, «somos convidados a criar também para nós este clima de seriedade e de empenho».

«Ser capazes de algumas vezes desligar o rádio e o televisor em nossa casa. Tomar em mãos um bom livro, abrir o Evangelho: ler, refletir, pensar em nossa vida, em nossos projetos, o que estamos preparando», indica.

Afirma também que é preciso «pensar nos que nos são caros, no significado de nossa presença em seu meio. Enfim no que pensamos fazer sob o olhar do Senhor».

«Quaresma é tempo de reflexão, porque o cristão é alguém que pensa. É preciso aprofundar, compreender: uma frase, por exemplo, do evangelho de hoje.»

«Jesus depois de quarenta dias voltou para o meio da gente e começou a pregar: “O tempo chegou, o reino de Deus está próximo, convertei-vos e crede no Evangelho”. São palavras sérias e comprometedoras», destaca.

O cardeal Agnelo enfatiza que este é um momento «de recolher-se em oração, fazer deserto. Aprender de Jesus, que se retirava de bom grado nos lugares solitários».

«Um pouco de escuta, de reflexão, de troca de ideias. Depois a volta à vida de todos os dias. Eis a surpresa: tornou-se diverso. Mudou-se por dentro», afirma.

Quem foram os evangelistas?

02 de abril de 2006
Vicente Balaguer

Os livros da Sagrada Escritura ensinam de modo firme, com fidelidade e sem erros, a verdade que Deus queria que ficasse registrada para nossa salvação. Falam, pois, de fatos reais.

Mas se pode expressar os fatos com veracidade servindo-se de vários gêneros literários, e cada gênero tem seu próprio estilo de contar as acontecimentos. Por exemplo, quando nos Salmos se diz que ?os céus proclamam a glória de Deus e o firmamento anuncia a obra das suas mãos? (Sl 19, 2), não se pretende dizer que os céus pronunciam palavras ou que Deus tem mãos; expressa-se o fato real de que a natureza dá testemunho de Deus, que é o seu criador.

A história é um gênero literário que na atualidade tem o seu modo peculiar de contar os fatos; modo este diverso daqueles utilizados nas literaturas do antigo Oriente Médio e inclusive na Antigüidade greco-latina. Todos os livros da Bíblia, tanto do Antigo como do Novo Testamento, foram escritos há 2-3 mil anos, de modo que seria um anacronismo qualificá-los de ?históricos? no sentido em que hoje damos a essa palavra, já que não foram pensados nem escritos com base nos esquemas conceituais atualmente em uso.

Todavia, o fato de não se poder qualificá-los de ?históricos? nesse sentido atual não implica na transmissão de informações ou noções falsas ou enganosas, e que por isso não mereçam credibilidade. Eles transmitem verdades e fazem referência a fatos realmente acontecidos no tempo e no mundo em que vivemos, contados através de modos de falar e de se expressar distintos, mas igualmente válidos.

Esses livros não foram escritos para satisfazer nossa curiosidade sobre detalhes irrelevantes para a mensagem que transmitem, como por exemplo sobre alimentação, vestuários ou hábitos dos personagens dos quais fala. O que proporcionam é sobretudo uma valoração dos fatos do ponto de vista da fé de Israel e da fé cristã.

Os textos bíblicos nos permitem conhecer o que ocorreu até melhor do que as testemunhas diretas dos acontecimentos, já que eles podiam não ter todos os dados necessários para avaliar em seu justo alcance o que estavam presenciando. Por exemplo, uma pessoa que passasse junto ao Gólgota no dia em que crucificaram Jesus dar-se-ia conta de que estavam executando um condenado à morte pelos romanos, mas o leitor dos evangelhos, além disso, sabe que esse crucificado é o Messias, e que nesse exato momento está a culminar a redenção do gênero humano.

BIBLIOGRAFIA

G. Segalla, Panoramas del Nuevo Testamento, Verbo Divino, Estella 2004; P. Grelot, Los evangelios, Verbo Divino, Estella 1984; R. Brown, Introducción al Nuevo Testamento, Trotta, Madrid 2002; V. Balaguer (ed), Comprender los evangelios, Eunsa, Pamplona 2005; M. Hengel, The four Gospels and the one Gospel of Jesus Chris : an investigation of the collection and origin of the Canonical Gospels, Trinity Press International, Harrisburg 2000.

Fonte: Opus Dei

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